Você olha para o lado e não vê ninguém; olha para o outro e continua enxergando o vazio que, ao que lhe parece, está presente em todos os lados. Afinal, tudo o que tem é “aquela pessoa”: única responsável por sua felicidade (ou infelicidade). Você vive com medo porque não pode perdê-la e, por isso, se sente o tempo todo hesitante. Vazio, medo. No fundo, sabe que faria tudo para atender as necessidades deste ser tão importante na sua vida, acaba aceitando qualquer tipo de tratamento, pois precisa fazer com que permaneça ao seu lado. Ela é especial. Mais especial, inclusive, que você próprio. Pior de tudo:  não consegue perceber o que está passando. Não aceita estar sofrendo de insegurança extrema, dependência emocional, ansiedade... 

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Reprodução/Facebook Projeto Morrer de Amor
Lorena Kaz é ilustradora e artista gráfica e, desde que se descobriu sofrendo em um relacionamento abusivo, ajuda outras pessoas com quadrinhos

Superficialmente, esta cena é a tentativa de transformar em palavras um pouco do sofrimento vivido – de verdade – por pessoas que se percebem vítimas da dependência emocional. Elas estão em todos os lugares e podem estar mais próximas do que você imagina. Se nunca ouviu falar sobre este problema, saiba que é prejudicial não só para quem sofre como também para todos ao seu redor, já que tem forte potencial de se tornar uma espécie de prisão emocional – dando chance à existência dos perigosos relacionamentos abusivos, por exemplo.

“É necessário falarmos sobre dependência, falta de autoestima e abuso. É urgente discorrermos sobre emoções, sejam elas quais forem. É preciso aprender a se entender e a se conhecer para sermos pessoas emocionalmente saudáveis, empáticas e amorosas”, defende a ilustradora Lorena Kaz, de 33 anos, que se descobriu sofrendo dependência afetiva durante um relacionamento vivido em 2012.

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Reprodução/Facebook Projeto Morrer de Amor

Quadrinhos abordam os relacionamentos humanos, amorosos, as pressões sociais e mais

“Algumas pessoas, ao primeiro sinal de abuso, dizem ‘não mereço isso’ e impõem um limite, terminam ou fogem da situação negativa. Já o dependente emocional, em geral, antes de estabelecer um limite, busca em si mesmo a culpa e os motivos para ser maltratado. E quem abre mão das próprias necessidades para mendigar amor acaba sentindo raiva”, explica.

Você pode até pensar “peraí, mas ninguém vive isolado e, sendo assim, todos dependemos de outras pessoas”. Sim, é verdade: estamos cercados de relações na família, no trabalho e na sociedade de maneira geral. Além disso, somos dependentes de situações e coisas (como o dinheiro)... E isso é saudável. Contudo, transforma-se em problema quando o foco de sua atenção vai para apenas uma pessoa – e também quando se dá mais atenção às necessidades dos outros em detrimento das suas próprias. “Tenho mais predisposição à dependência de um namorado, mas pode-se viver em dependência de praticamente qualquer pessoa ou situação”, pontua Lorena.

"Morrer de amor"

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Reprodução/Facebook Projeto Morrer de Amor

Compartilhar sentimentos, sentidos. O amor próprio, afinal. Esta é a marca maior no trabalho de Lorena

 Somos seres ricos, complexos, cheios de detalhes e especificidades que, em conjunto, formam nossa personalidade. Claro, vivemos situações diversas e lidamos com isso a nossa maneira. Somos, enfim, únicos. Porém, há dezenas de sentimentos e vivências que compartilhamos ao longo de nossa vida com outras pessoas, próximas ou não. Mesmo que cada um tenha sua religião, crença, modo de encontrar paz, todos vivemos o mesmo momento histórico, problemas políticos, sentimentos que envolvem a Humanidade como um todo, um “Zeitgeist”, que seja. 

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Quem nunca passou por, pelo menos, um “dia daqueles” – em que a vida parece vestir luvas de boxe e querer te dar um golpe que te derruba? Ou quem nunca olhou para um casal sorridente na foto da rede social e se questionou: será que esta felicidade mostrada é verdadeira? O que há por trás dessa demonstração pública de amor? Às vezes, somos nós quem vestimos máscaras, fingimos a felicidade para os outros e para nós mesmos, não é mesmo?

Compartilhar sentimentos, sentidos. O amor próprio, afinal. Esta é a marca maior no trabalho de Lorena que utilizou de seu dom de artista para ilustrar – literalmente – o cotidiano como ele é. Ou como ela enxerga e “ouve falar”. Abordando os relacionamentos humanos, amorosos, as pressões sociais, a depressão e a ansiedade (e tantos outros sentimentos), ela criou uma série de quadrinhos que já lhe renderam frutos.

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Reprodução/Facebook Projeto Morrer de Amor

Lorena lança um livro chamado “Morrer de Amor e Continuar Vivendo” (Editora Amora)

O projeto “Morrer de Amor”, nascido há quatro anos, se transformou em uma página no Facebook com mais de 135 mil seguidores. E não para por aí: ela já se apresentou em duas exposições (na Casa das Rosas, em São Paulo, em 2014; e em Piracicaba, interior do estado de SP, em 2015).

Agora, Lorena lança um livro chamado “Morrer de Amor e Continuar Vivendo” (Editora Amora) no próximo dia 21 de março, às 19h, no Conjunto Nacional, na capital paulista. A obra, que já se encontra em pré-lançamento, traz com humor, ironia e leveza, sentimentos diversos e vivências universais. Aliás, algumas ilustrações da autora estarão em exposição durante o lançamento.

Segundo ela diz, sua meta é estimular as pessoas a terem consciência de si mesmas. “Em nossa sociedade, os sentimentos são tratados como algo vergonhoso, pejorativo. Privilegiamos o racional ao máximo, chamamos quem sente de louco e abafamos os sentimentos até que virem doenças físicas. Não nos acostumamos a tratar a causa do mal-estar e, sim, os sintomas”, pontua.

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Reprodução/Facebook Projeto Morrer de Amor

O projeto “Morrer de Amor” nascido há quatro anos se transformou em uma página no Facebook com mais de 135 mil seguidores

É isso: de maneira bem humorada e um tanto quanto irônica, a ilustradora compartilha experiências, informa através da arte. Lutando e vencendo a dependência emocional – assim como outras ilusões e dificuldades da vida – através da arte, Lorena ainda gera emoções, defende o amor próprio e o respeito. “Sempre pensei que a arte existe para fazer a gente sentir. Não importa se é feia ou bonita, o que importa é que se sinta algo – e quanto mais faz sentir, melhor é a arte. Algumas pessoas vão se sentir compreendidas e retratadas no livro, outras vão ficar revoltadas ou mesmo sentir raiva por se verem retratadas. A ideia é causar emoção”, finaliza.

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