Ainda restam algumas semanas para o fim das férias escolares e muitos pais seguem elaborando uma programação para oferecer dias prazerosos e produtivos aos filhos. Pais de crianças com autismo sabem muito bem o planejamento que isso requer, já que os filhos pedem cuidados especiais.
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Como há uma grande quebra de rotina nesse período, crianças com autismo
sentem mais as mudanças e, geralmente, ficam mais ansiosas. Nesse sentido, planejar passeios e viagens pode ser um desafio.
No entanto, ter um filho com Transtorno do Espectro Autista (TEA) não impede a família de fazer viagens, explorar lugares novos e curtir bons momentos. A prova disso é Michelli Freitas, mãe de Benício, 5 anos, e Diogo, 8, um menino autista. Em entrevista ao Delas , a psicopedagoga especialista em Ensino Estruturado para criança autista, conta que a família divide as férias em duas partes: 15 dias viajando e 15 dias em casa com atividades que estimulam o desenvolvimento de Diogo.
A mãe conta que a família adotou estratégias e fez adaptações para deixar as viagens mais tranquilas e os roteiros interessantes aos dois filhos. Ela fala que primeiro passo para é trabalhar as expectativas em relação ao passeio de férias.
Muitas vezes, podem planejar visitas a lugares legais e divertidos, mas, chegando lá, a criança tem uma crise e o roteiro precisa ser repensado. “É preciso acertar expectativas para que as famílias não fiquem frustradas. É interessante adequar o passeio às necessidades individuais do seu filho e não só se basear em ‘toda criança gosta disso ou aquilo’”, aconselha.
Michelle lembra que em uma viagem ao “Beto Carrero World”, um parque que Diogo já conhecia e gostava, ele teve uma crise e precisou de um tempo para se acalmar. A mãe lembra que nesses momentos, além da atenção ao filho com TEA, é preciso dosar para que o irmão não seja penalizado e deixe de curtir o programa.
Além disso, a mãe reforça sobre como é importante que os pais não escondam que o filho é autista. “Seja no avião, no aeroporto ou em um restaurante, é sempre mais fácil que os pais falem com as pessoas. Algumas são mais compreensivas, outras menos. Mas é preciso falar e bater nessa tecla”, diz.
Um exemplo disso foi uma viagem de avião que a família fez. Na hora de passar pelo raio-x do aeroporto antes de embarcar, Diogo não queria soltar o ursinho de pelúcia que estava segurando. Michelle explicou que o filho era autista e o liberaram, o que evitou estresse e uma possível crise.
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Como planejar viagens e passeios com crianças autistas?
De acordo com Giovana Vasconcellos, psicóloga e analista do comportamento do Grupo Conduzir, não existem locais específicos ou passeios mais indicados para crianças com autismo, já que o espectro é muito amplo e as preferências podem variar de individuo para individuo. “Por isso, antes de qualquer coisa, os pais precisam saber quais são os interesses, habilidades e dificuldades da criança para que possam experienciar momentos prazerosos”, orienta.
Cinema, parque e espaços de recreação em shoppings costumam ser passeios clássicos das famílias nas férias. No entanto, geralmente, ficam muito cheios e, se a criança apresentar sinais de sensibilidade a ambiente cheios ou barulhentos, esses locais podem ser aversivos e devem ser evitados.
No entanto, a psicóloga reforça que não há uma regra de que esses lugares podem ser um problema para crianças com autismo, uma vez que indivíduos no espectro podem apresentar diferentes sintomas. “O que é aversivo para um não necessariamente vai ser aversivo para o outro”, diz.
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Previsibilidade
Antes de fazer uma viagem ou passeio de férias , a Michelle diz que sempre explica ao filho para onde a família vai. Ela explica que o ideal é fazer isso com imagens para a criança assimilar melhor. É recomendado mostrar fotos da estrada ou do avião, da cidade, do hotel e dos passeios que serão feitos lá.
“Elas ficam ansiosas e inseguras com o contato com um ambiente novo ou por não saber para onde irão”, complementa Giovana. Até mesmo em passeios mais “comuns”, como visitas a amigos e parentes, a psicóloga diz que é interessante avisar quem a criança encontrará e para onde vão. Essa previsibilidade é importante para ajudar a diminuir a ansiedade e insegurança.
“Para crianças com um déficit maior na comunicação esses comportamentos indesejados podem ser ainda mais intensos, já que não sabem como questionar ‘aonde vamos?’ ou ‘o que vai ter lá?’, por exemplo”, completa Giovana.
Viagem de carro ou de avião
O trajeto até chegar ao destino pode ser um desafio para as famílias, mas Michelli dá dicas valiosas sobre como deixar esse momento mais tranquilo. A mãe fala que costuma fazer viagens de longas horas de carro ou avião. Para isso, ela adota algumas estratégias.
Quando as viagens são de carro, ela e o marido cuidam para não ficarem muitas horas sem parar e planejam para que as paradas sejam prazerosas em lugares legais, como uma fazendinha. E o tempo que vão demorar a fazer o trajeto não importa muito. “Viajamos de carro para aproveitar o caminho”, diz. Dentro do veículo, os filhos são entretidos com vídeos e jogos no tablet.
Já nas viagens de avião, a família adota a estratégia de optar por voos longos noturnos e diretos, sem escala. Também escolhem companhias que oferecem recursos no avião como dispositivos eletrônicos para ver um filme. Além disso, em alguns casos a mãe dá melatonina ao filho como prevenção para garantir que ele durma a viagem toda.
Michelli fala que nem sempre foi fácil, mas hoje ela e o marido conseguem se planejar para evitar adversidades e sabem lidar melhor quando elas aparecem. “Vencemos batalhas, mas não deixamos de viajar por conta disso. Sempre adequamos nossas expectativas”, diz.
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Férias em casa
Mesmo que a família opte por não viajar, as férias de crianças com autismo em casa requer atenção especial. Michelli orienta que é importante que não apenas os pais, mas também avó, babá ou qualquer outra pessoa que também cuida de criança, esteja preparada para os momentos de crise. Afinal, mesmo em casa, ainda há a quebra de rotina.
A psicopedagoga sugere que os pais aproveitem as férias para focar em ensinar e estimular atividades do dia a dia, como tomar banho sozinho, lavar as mãos e trocar de roupa. Também vale fazer atividades que a criança goste, mas sempre pensando no desenvolvimento. É possível levá-la para a cozinha preparar uma receita e estimular a exploração sensorial.
Michelli também reserva um tempo para ele ficar livre como qualquer outra criança, brincando com o irmão ou vizinhos. A ideia é aproveitar esse momento para a socialização.
Como durante as aulas as tarefas escolares exigem muito tempo, as férias são interessantes para substituir esse período com estímulos para o desenvolvimento das habilidades de crianças com autismo .