Chefe tóxico: mulheres relatam abusos que sofreram no ambiente de trabalho

De trabalhar por longos períodos até assédio moral e físico, o chefe tóxico existe e pode despertar traumas severos. Leia os depoimentos.

Longas jornadas de trabalho. Assédio moral . Atrasos em pagamentos. Essas são só algumas situações relatadas por pessoas que já trabalharam com um chefe tóxico . As marcas desses comportamentos infelizmente não acabam da porta da empresa para fora e podem deixar marcas psicológicas e físicas severas.


A personagem Miranda Priestly, de 'O Diabo Veste Prada', é  um dos piores exemplos de chefe tóxico
Foto: Divulgação/20th Century Studios
A personagem Miranda Priestly, de 'O Diabo Veste Prada', é um dos piores exemplos de chefe tóxico

Recentemente a apresentadora  Ana Maria Braga revelou no programa Roda Viva, da TV Cultura, que  já quebrou o braço fugindo de um diretor de TV prestes a abusar dela sexualmente. Ela afirmou que correu em direção às escadas e rolou por um andar.

Segundo Ana Maria, o assédio aconteceu logo após seu chefe pedir que ela desenvolvesse um projeto, com a promessa de que poderia ganhar um programa de TV na parte da noite. “Quando levei, [o projeto] ficou na mesa dele. Ele me olhou, levantou da mesa e veio para cima de mim”, afirmou. Ela tentou denunciar, mas foi ignorada pela empresa. “Meu [outro] chefe fez de conta que não acreditou em mim”.

Nem sempre o chefe tóxico é uma versão parecida com Miranda Priestly, a personagem de Meryl Streep no filme ‘O Diabo Veste Prada’. O chefe tóxico pode ser uma pessoa cheia de conselhos amigos, sorrisos e ensinamentos para passar de primeira. Para te ajudar a identificar o chefe tóxico e comportamentos que não são legais, ouvimos relatos de mulheres que passaram por situações bem desagradáveis. Para preservar a identidade das leitoras, alguns nomes foram trocados.


Estágio dos pesadelos

"Foi quando estagiei na redação da minha universidade. Os professores supervisores eram ótimos, mas dois tinham comportamento tóxico. Eles berravam quando um aluno errava alguma atividade ou ortografia e ameaçavam cortar bolsa. A experiência da redação foi ótima, mas conviver com ameaças, escolha de estagiários favoritos e pedidos fora do horário de trabalho me fizeram ter medo do mercado de trabalho. Ainda bem que no meu novo estágio descobri que meus professores estavam errados". — Luiza, 20

O combo “perfeito” de chefe tóxico

"Tive um chefe em uma gráfica de médio porte que deixava os funcionários sem almoço enquanto não entregassem os cálculos necessários para as máquinas rodarem. Ele era estúpido, ríspido e agressivo, batendo coisas nas mesas de vidro para assustar os funcionário, colocando pressão na produção e sendo super mal educado. Além disso, ele não ficava nas salas da gráfica e fazia com que os funcionários ficassem passando frio no ar condicionado para não estragar as impressoras digitais que tinham lá dentro. Eu adoecia toda semana e se eu faltasse para ir ao hospital tinha de fazer horas extras para compensar, mesmo sendo jovem aprendiz na época".  — Gabriela, 21

A primeira impressão definitivamente não é a que fica

"Meu segundo estágio foi em uma grande emissora de televisão. Parecia um sonho,eu nunca imaginei que conseguiria trabalhar em um lugar como aquele. Mas tinha uma “lenda” de que nenhum estagiário durava no meu setor, porque a chefe gostava de humilhar e gritar. Nem dei muita bola, pensei que queriam me assustar porque ela sempre tinha sido legal comigo. Mas isso foi só no primeiro mês.

No mês seguinte começaram os gritos. Ela reclamava que eu era muito fofa e infantil, que eu não seria levada a sério. Uma dia chamou uma outra estagiária e eu em uma sala e disse que éramos incompetentes, que não passávamos de meras secretárias. Ela ainda me fez trabalhar no Natal e no Ano Novo, tive que passar essas datas longe da minha família.

Ela me fez duvidar da minha capacidade como jornalista. Eu também era julgada pela aparência, já que falavam que eu me vestia mal e que pessoas gordas não deveriam fazer jornalismo. Minha depressão piorou muito, ia para o trabalho chorando quase todos os dias, emagreci mais de 15 kg porque tinha medo de comer. Fiquei um ano lá, e no último dia contei tudo para o RH. Nada aconteceu. Ela até foi promovida e eu fiquei queimada na empresa. Meu único arrependimento foi não ter falado antes". — Clara, 24

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Boicote e intrigas

"Foi minha primeira experiência de emprego e foi bem ruim porque eu realmente não sabia nada. Eu tinha hora pra entrar, mas nessa de fazer extra para "bater meta" ou porque eu queria ajudar começaram a me explorar real. Passei a não ter hora para sair. O gerente um dia fez sumir todas as minhas vendas do sistema.

Ao lado de outros funcionários, sofri diversas situações de assédio moral disfarçado de piadinhas, episódios de racismo etc. Sem contar as mentiras que eles propagavam entre nós para gerar intriga entre os funcionários. Ainda demoraram para assinar minha carteira de trabalho e fui demitida antes disso, durante a pandemia". — Bruna, 24

Chefe tóxico também pode ser mulher

"Trabalhei por um ano e meio em uma estamparia. Fiquei mega empolgada e feliz pelas donas serem duas mulheres. Mas isso logo passou, porque minhas chefes constantemente me  assediavam fisicamente apertando meus seios e bumbum. Elas achavam que eu precisava fazer hora extra para “vestir a camisa da empresa” e, nesses dias, elas compravam pizza para “pagar” os funcionários.

Sofri muito abuso psicológico e chantagem emocional, porque nunca podia ter um compromisso fora do escritório ou falar não para algo que não concordava. Já fui humilhada na frente de todos os funcionários da empresa. Minha chefe me chamava de burra e inútil, aos berros, enquanto batia na mesa. As paredes tremiam.

Lembro que a última vez que saí de lá foi passando pela pior crise de pânico da minha vida. Se eu não tivesse ido ao hospital nesse dia, elas teriam me demitido por justa causa por ter ido embora no meio do expediente. Fui demitida no dia seguinte, mas entreguei meu atestado da emergência psiquiátrica para "rebater" a justa causa". — Larissa, 21

Show de racismo

"Trabalhei em uma loja de doces e cafeteria em que os chefes faziam “brincadeiras” homofóbicas , racistas,  gordofóbicas e muito assédio moral. Um dia a loja estava com o ar condicionado queimado. Tinha muita gente e vários pedidos na cafeteria. Como a loja estava extremamente quente, todos os funcionários foram para fora menos o barista, que era negro. Um colega comentou: “Tadinho do fulano, está muito calor lá dentro”. Então o chefe simplesmente falou: “Não se preocupa, ele está acostumado. A cor ajuda”.   — Lis, 24

Quando o chefe tem ciúme de você

"Quando eu tinha entre 15 e 17 anos, trabalhei em um lugar em que meu chefe queria saber da minha vida pessoal a todo custo. Uma vez comecei a namorar um menino e ele cismou com o garoto por algum motivo. Com isso, ele começou a não querer me pagar almoço e queria que eu comesse da marmita dele. Ele tentou mexer no meu computador, que era de uso pessoal.

Um dia passei muito mal e deixei o computador ligado. Ele acabou lendo minhas mensagens e ficou p*to porque contei para o meu namorado tudo que ele dizia. Não voltei ao trabalho nesse dia. Meu namorado foi buscar minha mochila, e esse chefe ainda se achou no direito de brigar com meu namroado, dizendo que ele não podia pegar as minhas coisas e que era para ele sumir". — Juliana, 19

Sem horário para sair

"Trabalhava como recepcionista em uma grande rede de salões de beleza. Minha chefe e o funcionário da administração, que respondia por ela na sua ausência, eram totalmente tóxicos. Eu trabalhava só com horário para entrar, sem previsão para sair. Em alguns dias eu não tinha nem almoço, entrava 13h e saía quase 22h. Os funcionários tinham que bancar com o dinheiro da passagem, porque o vale transporte era pago com 3 a 5 dias de atraso. Foi a pior experiência que tive, às vezes ia embora chorando". — Helena, 20

Amiga, só que nem tanto

"Trabalhei em uma escola em que a coordenadora manipulava todo mundo e criava situações para provar que estava sempre certa. A diretora acreditava em tudo que ela falava. Ninguém parava no emprego, porque ela exterminava todas as coordenadoras que entravam para dividir o trabalho. Em 15 anos que trabalhei lá ela demitiu 10 profissionais, e sempre do mesmo jeito: conquistava a pessoa, se fazia de amiga e depois dava o bote". — Claudia, 54