No último domingo (17), a pequena Isadora veio ao mundo no Hospital e Maternidade São Luiz, na cidade de São Paulo, pesando 3,350kg e medindo 49cm. O parto, inicialmente programado para o início de junho, precisou ser adiantado exatamente por conta do seu tamanho, o que também antecipou a alegria da família.
Porém, engana-se quem imagina que a gestação foi tranquila. Morando em Portugal, a nova mamãe *Maria Silva voltou para a casa dos pais no Brasil ainda nos primeiros meses da gravidez e teve que encarar os problemas causados pela pandemia do Covid-19 bem de perto: tanto seu pai quanto sua mãe acabaram contraindo a doença.
Leia também: Consultas, vacinas e mais: como sair com recém-nascido com segurança na pandemia
"Nós viemos para o Brasil no final de 2019, porque eu queria que ela nascesse aqui. Fiz alguns exames antes do carnaval e, como a situação ainda não estava do jeito que está hoje, o meu marido voltou para Portugal, porque precisava cuidar de algumas coisas da empresa antes de ficar de vez por aqui. Quando ele foi, eu fiquei na minha mãe. Nesse meio tempo, os casos começaram a aumentar", lembra.
"Comecei a ficar mais preocupada com meus pais, porque eu praticamente não saia de casa, mas eles insistiam em ir ao mercado e fazer compras em outros lugares. Acho que pela questão da idade, não tinham muita confiança de usar aplicativos. Então, eu só podia aconselhar e pedir para usarem o álcool em gel", complementa.
"Não sabemos como aconteceu"
Por volta do dia 12 de março, quando o irmão voltou da Espanha, a família toda foi celebrar o aniversário do cunhado dela em uma churrascaria de São Paulo. Maria acredita que o contato com diversas pessoas no estabelecimento pode ter sido o causador da infecção na mãe.
"Depois desse dia, eu e ela ainda fomos em uma consulta com a minha médica. Naquela data também fiz um ultrassom, então a minha sogra foi junto. Lembro que, por termos estacionado na entrada do pronto-atendimento, tivemos que atravessar o hospital para chegar ao consultório", relembra.
Leia também: Covid-19: a tortura psicológica vivida por tripulantes confinados em cruzeiros
A partir daí, uma tosse persistente teve início. Como a mãe tem diversos tipos de comorbidades - cardiopatia, asma e diabetes -, Maria achou melhor pedir ajuda ao cunhado, que é medico e já conhecia o histórico da sogra. Neste momento, ele deixou um pedido de teste de Covid-19 e de tomografia dos pulmões. Porém, o quadro se agravou rapidamente.
"Depois que eles foram embora, meu pai saiu para comprar o antibiótico que meu cunhado tinha receitado. Ao chegar em casa, minha mãe disse que não estava se sentindo bem e que achava que estava com febre. Como não estavam realizando a coleta para o exame em casa, levamos ela no dia seguinte ao hospital. Ao chegar lá, ela já precisou de oxigênio e, como estava com a saturação baixa, acabou sendo internada", recorda.
De início, os médicos cogitaram a possibilidade de ser um ataque de asma e ministraram corticóides, o que levou a uma melhora inicial. Porém, quando recebeu a segunda dose, a mãe de Maria teve uma piora considerável, a ponto de quase precisar ser encaminhada para a UTI.
"Nesse momento, pediram para acelerar o resultado do teste de Covid-19, porque ele podia demorar de três a sete dias. Quando confirmou que era o novo coronavírus, cortaram o corticóide na hora. Ela só melhorou quando os remédios saíram do organismo dela. Aí, começou o processo de testar a oxigenação, que não podia ficar abaixo de 90%", conta.
Você viu?
Leia também: Diagnosticada com Covid-19, mãe conta como foi dar à luz sem poder ver o filho
Ao todo, foram sete dias de angústia até a aguardada alta. Como já não precisava do auxílio do respirador, ela teve autorização para deixar o hospital. Segundo Maria, a ideia também partiu da família, que achou melhor seguir o tratamento no conforto de casa. Porém, com o seguinte aviso: caso os níveis de oxigênio no sangue caíssem, seria preciso voltar.
Foco na gravidez
Passado o susto, e com a mãe se recuperando bem, Maria pôde voltar todas as suas atenções para a filha, uma vez que a gestação ainda estava longe de terminar e os exames de pré-natal precisavam ser feitos.
"Eu fiquei com sintomas de gripe três vezes ao longo da gravidez. Em cada uma, tive problemas diferentes e não cheguei a ficar realmente ruim. Então, mesmo tendo que sair de casa algumas vezes para fazer exames, sempre estive bastante tranquila, principalmente por ter lido muito sobre o assunto e ter visto que dificilmente o bebê é infectado se a mãe pega a doença", diz.
Leia também: Por que o corpo nu da mulher grávida incomoda tanto?
Tal "despreocupação" é analisada pela doutora Erica Mantelli, ginecologista, obstetra e especialista em saúde sexual. Segundo ela, as gestantes, apesar de incluídas no grupo de risco recentemente pelo Ministério da Saúde, não apresentam maior pré-disposição do que a população geral e, em sua maioria, vão ter os mesmos sintomas comuns aos outros grupos. Porém, é preciso estar atento para não confudir a Covid-19 com um cenário normal de gravidez.
"Os sintomas podem se misturar, até esse cansaço e falta de ar, com os próprios sintomas de final de gestação. Por isso, é importante ter bastante cuidado e não se desesperar aos primeiros sintomas, procurar ajuda, principalmente via ambulatorial, via telefone, sem ter que ir direto ao Pronto Socorro. As vezes a mulher vai sem os sintomas de Covid, sem nada, e por ficar lá, com pessoas que podem estar contaminadas, aumenta o risco de contrair", aponta a médica.
Leia também: Vacinação: apenas 37% da meta de segunda fase no país foi atingida
Ela complementa ainda que também não há confirmação de aumento do risco para abortamento, perda gestacional ou má formação fetal e que até o momento os dados sobre trabalho de parto prematuro não estão necessariamente ligados ao Covid-19: "a equipe médica pode ter resolvido interromper a gestação porque a mãe tinha outra doença associada, alguma comorbidade. Então, é cedo para dizer que o vírus provoque isso".
Próxima etapa: amamentar
Após receber alta nesta quarta-feira (20), Maria e a pequena Isadora agora darão início a uma nova etapa nessa relação, não menos importante do que todas as anteriores: a amamentação. Como os dados ainda não são conclusivos sobre uma possível transmissão via leite, a nova mamãe poderá seguir tranquila e garantir que a filha tenha acesso a esse importante sistema de defesa para os recém-nascidos.
Leia também: Covid-19: vacina surgir em até um ano é cenário "otimista", diz agência
"Para as mães que tiveram o Covid-19 confirmado ou suspeito, não existe recomendação de suspender o aleitamento. Pelo contrário, os benefícios superam os riscos. Então, é para manter o aleitamento, porém com a lavagem periódica das mãos e o uso de máscara, para evitar de passar gotículas para o rosto do bebê. No mais, aleitamento normal", finaliza a doutora.
*Nome modificado a pedido da entrevistada