Não é de hoje que a empresária Valquíria Teixeira, a Val, é vista como exceção em um mercado majoritariamente masculino. Quando em 1993 começou a empreender com a família, sabia o tamanho do desafio que tinha pela frente. Após anos atuando no atacado, ela e os irmãos optaram por investir no varejo e fazer das lojas instaladas na zona leste de São Paulo, um diferencial na área de material de construção. Deu certo.
A proposta chamou atenção no mercado a ponto da Suvinil os escolherem como uma de suas primeiras distribuidoras exclusivas; assim nasceu a Safari, com atuação, inicialmente em Guarulhos e Alto Tietê, assumindo depois a Zona Leste, Zona Norte, Zona Noroeste e Abcd. “Eu fui uma das primeiras mulheres a montar um negócio no setor e a ter uma distribuidora. Não havia presença feminina, que dirá mulheres em posição de liderança”, afirma orgulhosa. “Foi difícil, desafiador, mas gratificante”.
Quase três décadas depois, o cenário não é muito diferente. De acordo com a pesquisa Mulheres da Construção: Desafios e Oportunidades, apresentada pelo Movimento Mulheres na Construção, as mulheres ocupam apenas 24,7% dos postos de trabalho no varejo do segmento, percentual que cai para 19,2% na indústria.
Com personalidade forte e adepta da gestão humanizada, Val não teme o pioneirismo. Pelo contrário. Em janeiro de 2023, a empreendedora se tornou a primeira presidente mulher da Associação Brasileira dos Revendedores de Tinta (ABRART), entidade fundada em 1966. “Vivemos uma nova era, quando cheguei ao setor, as pessoas não acreditavam que uma jovem seria capaz de administrar com sucesso uma empresa na área de material de construção”, afirma.
“Hoje, tem até associação de mulheres pintoras”. Ela não esconde, porém, que o desafio é grande e exige resiliência e determinação. “Os avanços acontecem numa velocidade aquém do esperado”, diz. “A mulher ainda hoje tem de trabalhar duas vezes mais para mostrar sua competência. Não tem segredo, a regra é trabalho, trabalho, trabalho”.
Val tem planos ambiciosos para sua gestão à frente da ABRART no biênio 2023/2024. “O setor é muito pulverizado e a nossa principal proposta é trazer o pequeno lojista para a associação, porque é ele que mais precisa de treinamento, assistência contábil e jurídica”, afirma. “Para tanto, trouxemos para a diretoria uma representação diversa do setor, com empresas de todos os portes, com empresários e empresárias extremamente competentes”.
Defensora de equipes mistas, com competências complementares, Valquíria acredita que sempre é possível virar o jogo, promover a transformação. “Ninguém é capaz de alcançar o sucesso sozinho, seja na vida ou nos negócios”, declara. “É preciso respeitar os pontos fortes de cada um e trabalhar por um objetivo comum”. Trabalhar para ampliar a profissionalização do setor também é uma das propostas da presidente. A adoção de um programa de governança corporativa na Safari é a tradução na prática do que a empreendedora prega. “A segunda geração está presente em nossa empresa há quase 15 anos, e quanto mais profissional formos, mais longeva a empresa será”, afirma.
Foi ainda na adolescência que Val se deu conta que não medir esforços para conquistar seus objetivos valia a pena. Em casa, procurava ser ouvida na mesma medida dos irmãos. Aos 16 anos, resolveu desbravar o mundo. Foi trabalhar escondida do pai, ganhar o próprio dinheiro. “Rompi barreiras, conquistei minha liberdade”. Mais tarde, formada em Direito, mal teve tempo de exercer a profissão, e partiu para empreender junto com seus irmãos.
Sob a administração de Val, a Safari cresceu. Atualmente, atua exclusivamente na área de distribuição, abastecendo varejos especializados. São 90 fornecedores na carteira, entre eles, grandes fabricantes como a Suvinil, onde atua como Distribuidora Platinum Exclusiva. Os 130 funcionários dividem-se entre o Centro Logístico de Itaquera, de onde partem os caminhões, e a sede administrativa, no bairro Anália Franco.
Val faz questão de ressaltar que o sucesso de uma boa gestão está no equilíbrio, em saber ouvir e fazer do exemplo o fio condutor para que a equipe caminhe junto e busque os mesmos objetivos. “A mulher tem um olhar mais humano para o negócio isso faz diferença”, afirma. A filha Thais que chegou à Safari em 2010 , sabe bem o que isso significa. “É comum no dia a dia termos opiniões conflitantes, porém, sempre pautadas em argumentos sólidos”, conta.
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“Embora as discussões sejam acaloradas, buscamos juntas a tomada da melhor decisão”. Thais ressalta que a mãe sempre deixou claro que ela poderia ser o que quisesse, desde que trabalhasse para isso. “Ela sempre venceu pela persistência e isso se tornou um exemplo para mim”, afirma. “Ela é a base do que me tornei, do que sou”.