O Dia Internacional da Mulher é celebrado hoje, 8 de março. Oficializada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1977, essa data é marcada pelo reconhecimento das conquistas sociais, econômicas, culturais e políticas do sexo feminino.
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Em todo o mundo, não é difícil encontrar comemorações, festas, eventos publicitários e ações que tentam capitalizar em cima dessa data. Seja em presentes, ações de marketing ou em encarecidas palestras, muito se fala em ‘celebrar o ato de ser mulher’. Mas, mesmo com tantos avanços, será que existe algo a comemorar?
Segundo as últimas pesquisas sobre igualdade de gênero realizadas no Brasil, a realidade de ‘ser mulher’ no Brasil ainda é marcada pela desigualdade e a violência.
É o que aponta a quarta edição da pesquisa “Visível e Invisível”, produzida pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) em parceria com o Datafolha. De acordo com o levantamento, mais de 18 milhões de mulheres sofreram alguma forma de violência em 2022 no país, 5,88% a mais do que no ano anterior.
Os dados revelam que existe uma verdadeira ‘epidemia de violência’ contra as mulheres - por meio de ofensas verbais, perseguição, ameaças, chutes e socos, 14 mulheres foram agredidas por minuto.
A violência não para por aí: o país registrou, em 2022, um caso de feminicídio por dia, atesta a pesquisa “Elas Vivem: dados que não se calam”, da Rede de Observatórios da Segurança. Isso significa que, por dia, uma mulher perdeu a vida simplesmente pelo fato de ser mulher.
“Seja por causa de sua condição de gênero, por conta de relacionamentos abusivos ou por não seguirem normas tradicionais de gênero, centenas de mulheres são assassinadas, ou seja, sofrem feminicídio. Desde 2015, nossa lei considera isso um crime hediondo”, explica Ana Beatriz Santos, historiadora e especialista em Estudos de Gênero.
Além disso, conforme aponta a FBSP, 46,7% das mulheres brasileiras de 16 anos ou mais sofreram alguma forma de assédio no último ano - isso equivale a 30 milhões de pessoas que não tiveram seus corpos respeitados nas ruas, no trabalho, no transporte público ou até mesmo dentro de casa.
Um dia de luta
“Eu sempre prefiro encarar o dia da mulher como um dia de luta”, conta a advogada e doutora em Direito Constitucional com ênfase em Direitos Humanos, Melina Girardi Fachin. “Reconhecer os avanços e ganhos do que se passou, mas estar atentas para a nossa realidade que ainda é muito discriminatória para alterar as perspectivas futuras.”
Em termos de combate à violência, Melina acredita que a legislação avançou bastante. “A partir da lei Maria da Penha tivemos um robustecimento no sistema legal e de justiça muito importante.” O problema, para a especialista, é que a modernização das leis brasileiras nem sempre se traduz em uma mudança de comportamento social, que “ainda, infelizmente, normaliza a violência contra as mulheres.”
“Nosso problema não é de fato por falta de leis, é por falta de uma cultura que fortaleça a aplicação das leis e garanta que as mulheres confiem no sistema de justiça para uma resposta segura e não revitimizante das discriminações e preconceitos sofridos”, relata.
A lenta eficiência do sistema judiciário também prejudica o acesso à segurança das vítimas. Sem qualquer apoio ou proteção do Estado, elas acabam reencontrando seus agressores, que permanecem impunes.
Por isso, é necessário que o Estado leve em conta a perspectiva de gênero em todos os aspectos. “O sistema judiciário tem que ser mais eficiente, dando maior agilidade à atuação dos magistrados em processos que envolvam a violência contra a mulher, reforçando as suas estruturas, ampliando varas exclusivas em processos de violência contra a mulher, salas de atendimento privativas e aumentando os setores psicossociais”, afirma a advogada Fernanda Ramos.
A advogada Eduarda Chaves reforça que, para que a desigualdade de gênero seja combatida, é necessária a existência de um Estado que garanta uma maior agilidade nas medidas protetivas de urgência. Assim, as mulheres conseguem ficar protegidas de seus agressores. “Entre as possíveis mudanças, podemos citar a melhoria do monitoramento das medidas protetivas, por meio de audiências e tecnologias, como dispositivo de segurança e a tornozeleira eletrônica que é colocada no ofensor.”
Melina cita outras medidas efetivas contra a desigualdade e a violência, como a adoção de políticas de igualdade de gênero, a ampliação do acesso à educação e à capacitação profissional para as mulheres, a promoção de medidas que incentivem a divisão equitativa das responsabilidades familiares entre homens e mulheres, além da conscientização da sociedade sobre os problemas enfrentados pelas mulheres no ambiente público.
A conscientização e a promoção de políticas públicas educacionais acerca da igualdade de gênero é uma das principais alternativas para a melhoria desse cenário, atesta a advogada.
“Como professora, eu acredito que o papel da educação é fundamental. Não se muda uma cultura patriarcal de outro jeito que não ensinando com perspectiva de gênero pela equidade e diversidade. No Brasil não nos faltam leis neste sentido, mas mesmo assim ainda vivemos uma endemia de violência contra as mulheres, o sistema de justiça nem sempre resposta da forma robusta que deveria. Só a educação possui este impacto transformador radical da realidade”, finaliza.