“Nunca sonhei em ser mãe quando eu era criança ou adolescente. Tudo o que eu queria era sair do sertão de Rodelas, interior da Bahia e ajudar minha família, pois onde eu morava não tinha chance alguma de melhorar de vida. Eu queria ser ter independência financeira, vencer na vida. Também nunca sonhei com um príncipe encantado, mas queria encontrar alguém que somasse à minha vida.
Minha história começa quando, em 2013, eu tinha dois anos de carreira como atleta de fisiculturismo, competia sem parar e me inscrevi para o campeonato Arnold Classic, que seria realizado no ano seguinte em Ohio, nos Estados Unidos, e também no Brasil. Estava focada em vencer a competição e nem pensava na possibilidade de ser mãe.
Na mesma época, em 2014, me casei com o Eduardo. Estava muito feliz com a vida nova e queríamos viajar pelo mundo, não queríamos filhos no momento, mas apenas quando eu ganhasse muitos campeonatos. Estávamos planejando uma viagem para as Ilhas Maldivas . Estava cheia de sonhos com ele quando a federação de Ohio solicitou que fizéssemos exames antes do campeonato, assim o fizemos e uma bomba caiu sobre nossas vidas: descobrimos um câncer no meu fígado e meu mundo desmoronou. Nunca tive qualquer tipo de doença e jamais imaginaria que pudesse acontecer.
Imediatamente, eu comecei a fazer quimioterapia, meu marido me ajudou muito porque eu estava bem triste com tudo o que estava acontecendo. Nesse tempo, quase dois meses depois de iniciar o tratamento, sentia enjoos estranhos todos os dias e era um sintoma anormal, por mais que eu estivesse em tratamento. O médico me pediu para eu fazer um beta HCG [exame para identificar uma possível gravidez]. Para nossa surpresa, o mal estar e enjoos eram por causa de uma gestação inesperada. Já não bastasse essa notícia, eu estava esperando gêmeos. Fiquei em choque! Não imaginaria que fosse uma gravidez, até porque meu médico disse que isso não seria possível.
Senti um desespero sem tamanho. ‘Meu Deus, grávida e de gêmeos e ainda com câncer’. Fiquei sem saber o que fazer, pensei que iria morrer. Eu só conhecia histórias de pessoas que não se curavam do câncer e me ver grávida naquela situação, eu só imaginava que não iria sobreviver. Nesse momento, você não tem mais certeza de nada e muito menos em fazer planos.
Eu estava muito abatida neste período, mas a vinda dos bebês me fez ter forças para lutar. Queria muito meus filhos e eu sabia dentro do meu coração que Deus guardava um propósito para mim e para eles. Eu me ocupava tanto sendo gestante, que quis me fazer mais. Adotei dois cães recém nascidos, o Pingo e o Bob, que eram um Lhasa Apso e um Yorkshire , respectivamente. Meu Deus, eles não me deixavam dormir, mas foram minha salvação, porque eu vivia cuidando deles e, vendo minha barriga crescer, me sentia viva.
Pingo e Bob viviam deitados na minha barriga, eles sabiam que ali tinha vida e eu estava tão feliz, apesar de toda dor. Meu médico alegava que minha gravidez era de risco e não achava oportuno continuar a gestação. Mudei imediatamente de médico porque não aceitei essa opinião e queria ter meus filhos. Na época, nem me lembro o que pensei sobre, mas tinha certeza que com aquele médico não iria continuar.
Recebi a notícia que um dos meus bebês havia morrido ainda na barriga e eu decidi seguir com a gravidez. Fiquei profundamente abalada com o que aconteceu e até hoje eu não esqueço. Eu sentia um misto de medo do bebê nascer com sequelas ou de eu não estar presente para criar ele, mas a esperança de ter meu filho me fazia forte. Foram meses muito difíceis até o dia do Dudu nascer em janeiro de 2015.
Recomeço
No dia do parto, tive vários problemas, minha pressão caiu várias vezes e o Dudu não queria sair de jeito nenhum. O tempo de nascer passou, chegou ao mundo todo roxo, eu achei que realmente fosse morrer e tiveram que tirá-lo com fórceps, o que o deixou machucado. Eu vomitava muito, não ouvia o Dudu chorar e entrei em pânico.
Quando peguei o Dudu pela primeira vez nos meus braços foi a maior emoção do mundo, mas tudo foi muito rápido porque o internaram na mesma hora. Tive muito medo de perder meu filho, mas Deus não deixou que ele fosse embora. Apesar de tudo, só de olhar para ele, meu coração explodia de alegria e alívio. Era a alegria da minha vida tê-lo em meus braços pela primeira vez e sentir o cheirinho dele. Amamentá-lo foi único. Como fui feliz daí em diante...
Infelizmente não pude mais manter o Pingo e o Bob conosco e ele foram para a casa da minha sogra. Os dois ficaram muito bravos com a chegada do Dudu, sentiram ciúme e um deles chegou a me atacar enquanto eu estava com o meu filho nos braços, durante a amamentação. Sinto saudade deles e sei que era ciúme porque eles também eram crianças.
Quando ele nasceu, continuei o tratamento mais algum tempo e, como Deus foi generoso, Ele me curou. Hoje faço exames periódicos e estou curada. Não sei como isso pode ter acontecido, mas ninguém é maior que Deus, a minha fé foi inabalável e a vida de meu filho foi minha cura definitivamente. O Dudu foi diagnosticado com autismo e TDAH [Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade] e acreditamos que o tratamento da quimio tenha uma parcela a ver com isso.
Hoje, eu e o Eduardo pensamos na possibilidade de ter outro filho para fazer companhia ao Dudu. Ainda não contamos toda essa história para ele, mas um dia contaremos quando ele tiver entendimento. Ele é autista, então não entende bem algumas coisas, vamos deixar o tempo passar”.