“Tive que aprender a amar meus filhos”

Meninas que moraram – e engravidaram – nas ruas contam a experiência da maternidade

Bia usa anticoncepcional injetável. Marina prefere camisinhas e, em situação de deslize, recorre à pílula do dia seguinte. Tati quando descobriu o sexo era tão jovem que nem desconfiou ser gravidez o ventre estar mais saliente. Luara primeiro encontrou o crack, depois veio a maternidade. Por isso, só após a quarta gestação, se reconhece mãe.

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“Tive que aprender a amar meus filhos”, define a moça, hoje com 28 anos e há sete meses longe das ruas de Santos (litoral paulista) e das drogas, respectivamente sua moradia e companhia por 16 anos. “Aprendo aos poucos, mas ainda enlouqueço quando eles choram e eu não entendo o que querem”, diz ela sobre o primogênito de 11 anos, a do meio de 8, o terceiro de 2 e a caçula de só de um mês, todos gerados em situação de risco.

Nos últimos 40 dias, o iG acompanhou histórias de 14 “meninas do asfalto” e, desde ontem, publica uma série de reportagens especiais sobre o assunto . Na matéria de hoje, o vídeo retrata como elas conciliam vaidade, vulnerabilidade e maternidade. “Eu só encontrei um motivo para viver depois que a minha primeira filha nasceu. Foi a minha salvação”, resume Tati, hoje com 21, que coloca um ponto final feliz na sua história que começou aos 11 anos na rua e recomeçou aos 15 quando ela engravidou.

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As mães que experimentaram a gravidez após a vivência nas ruas foram entrevistadas na Ong Lua Nova, com sede em Sorocaba (interior de SP), que tenta resgatar o espírito materno destas meninas, promover a reinserção social e ajudá-las a terminar (ou começar) os estudos. Algumas conseguem profissões e empregos, constroem casas, recuperam filhos já deixados em abrigos. Uma parte volta para as ruas ou tem recaídas nas drogas. "Mas o nosso papel é aumentar o leque de possibilidades de futuro para estas garotas", afirma Aline França, educadora do Lua Nova.

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No centro paulistano, as meninas e meninos recebem apoio da Fundação Projeto Travessia , uma organização social que, desde 1995, trabalha com adolescentes e crianças em situação de risco. Em visitas diárias, eles oferecem a cada menino e menina, uma auto-reflexão sobre os riscos constantes a que estão sujeitos, para reconstruir coletivamente o sonho de um futuro melhor e a capacidade de transformar suas histórias pessoais.

Assuntos femininos
Segundo o último censo de meninos de rua, feito pelo Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) , hoje estão espalhadas pelas calçadas e esquinas de 75 cidades brasileiras 6.800 garotas com menos de 18 anos. Elas são 25% da população de rua que não completou a maioridade. Apesar de minoria, as questões sobre a sexualidade embutem desafios complexos no grupo feminino.

São elas que experimentam a primeira menstruação longe das explicações e conselhos dos adultos. Também convivem com as alterações de humor – e curiosidade pelo sexo – por causa dos hormônios à flor da pele. Porém, vulneráveis à falta de proteção familiar e afetiva, também dificilmente escapam do abuso sexual e da gravidez precoce.

São enredos recorrentes entre as meninas em situação de rua mesmo para aquelas que, nos últimos anos, chegaram a uma posição de liderança dos grupos de meninos e meninas. Algumas, por conta própria, aprendem o que é sexo seguro (como é o caso de Marina, 17, e Bia, 19) e mensalmente buscam auxílio nas unidades básicas de saúde. A intimidade se dá a céu aberto e, sem constrangimento, vão para debaixo dos cobertores ter relações com os namorados, que não raro chamam de marido. Outras só visitam os médicos na hora de parir, sozinhas e sem amparo dos pais das crianças.

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