A atriz Jennette McCurdy lançou sua autobiografia, “Estou Feliz que Minha Mãe Morreu”, na última semana. Na obra, Jennette detalha a relação tumultuosa que tinha com a mãe, Debra McCurdy, até sua morte, em 2013. Debra tinha todos os traços de uma mãe narcisista.
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Conhecida internacionalmente por sua atuação como Sam Puckett na série "iCarly", McCurdy iniciou sua carreira em Hollywood ainda na infância. Aos oito anos, a jovem estrelou séries como "Mad TV", "CSI" e "Strong Medicine" e, aos treze, se tornou uma sensação internacional do canal infantil Nickelodeon.
Por trás de todo o sucesso, a jovem escondia de amigos e fãs que sofria de uma relação disfuncional e totalmente abusiva com a própria mãe.
Quando Jennette tinha apenas seis anos, Debra a induziu a participar de testes de elenco para a televisão, já que alegava que uma carreira como atriz era seu verdadeiro grande sonho. Quando a atriz começou a passar pela puberdade, a mãe passou a encorajar distúrbios alimentares na filha para que ela conseguisse mais papéis de crianças em séries e filmes.
Até os 17 anos, Jennette era obrigada a tomar banho junto de seus irmãos. Debra a banhava, lavava seu cabelo e aplicava os chamados "exames de rotina", em que examinava as partes íntimas da atriz.
Na obra, ela confessa: "Minha mãe não merecia seu pedestal. [...] Ela se recusou a admitir que tinha algum problema, apesar do quão destrutivos esses problemas foram para nossa família inteira. Minha mãe me abusou emocionalmente, mentalmente e fisicamente de maneiras que irão me impactar para sempre".
Por mais que Jennette não soubesse, a situação era clara para os psicólogos que analisaram a atriz, como ela relata no livro: ela sofria um relacionamento abusivo com uma mãe narcisista.
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Mães narcisistas
Segundo a psicóloga Tatiane Terezo, as mães narcisistas são marcadas por comportamentos abusivos e autocentrados. “A grandiosidade do narcisista se dá pela angústia e pelo sentimento de vazio que essa pessoa carrega. Ou seja, a mãe narcisista não consegue se amar, então busca este amor no outro, nesse caso, o próprio filho”.
“Essas pessoas carregam uma autoestima extremamente frágil, já que se magoam com facilidade e culpam os outros com rapidez. Elas também não têm empatia alguma e não se importam de usar estratégias agressivas para conseguir o que querem”, detalha a especialista.
Na obra, Jennette detalha que, por ter sido curada de um câncer em estágio quatro, Debra utilizava a doença para culpabilizar todos a seu redor. A profissional explica que mães narcisistas, como ela, buscam se vitimizar como forma de camuflar a baixa autoestima.
Entre outros fatores, as mães narcisistas também monopolizam recursos financeiros, exibem um alto nível de perfeccionismo, não assumem seus erros e também não conseguem pedir perdão.
Frases como “Você só tem tudo isso porque eu te dei”, “Você deveria perder alguns quilinhos”, “Você é muito ingrato”, “Não me questione”, “Eu era muito mais bonita que você na sua idade” e “Você não faz nada direito” são comuns na vida de filhos de pais narcisistas.
Em 2009, a psicoterapeuta Karyl McBride tipificou, em seu trabalho, as mães narcisistas em seis perfis: a carente (que precisa de atenção o tempo todo); a psicossomática (que usa doenças para ganhar atenção); a secretamente má (que esconde o lado abusivo das pessoas); a viciada (que ama mais o vício do que os filhos); a focada no sucesso (para ela, a vida precisa de realizações profissionais para fazer sentido) e a extrovertida (por fora, ela parece ser a melhor mãe, e faz de tudo para mostrar isso).
Todos os perfis apontados por McBride afetam a saúde mental dos filhos desde a infância, como detalha a psicóloga clínica Rafaela Azevedo: “Muitas das necessidades básicas do ser humano não são atendidas, porque são mães muito instáveis. Uma hora, o humor delas está normal, e, no outro momento, elas estão irritadas e explodem com muita facilidade. A criança acaba se sentindo muito vulnerável a essas oscilações”.
"A criança também não consegue desenvolver um vínculo de afeto com essa mãe, já que ela se sente sempre muito criticada, como se estivesse disputando com a própria mãe. Os filhos, então, se tornam emocionalmente distantes por conta do excesso de críticas. Eles nunca são validados como deveriam", completa.
Na idade adulta, essas vivências são refletidas em todas as esferas da vida dessas pessoas. Comportamentos como insegurança, a busca por parceiros abusivos, autocobrança extrema e instabilidade emocional assombram o crescimento dos filhos de mães narcisistas.
Tendências autodestrutivas também impactam os relacionamentos e vida profissional desses adultos. A impossibilidade de criar limites saudáveis com outras pessoas, a dificuldade em estabelecer a própria identidade e a necessidade de validação externa também são problemas para quem sofre com mães abusivas.
Segundo Rafaela, um dos fatores que dificulta a percepção de relações tóxicas entre mães e filhos é o senso comum de "instinto materno" e do "amor de mãe". “O papel de mãe é uma função, e, antes dele, a mulher que exerce esse papel sempre esteve lá. Se ela é uma mulher com transtorno de personalidade narcisista, ela não vai conseguir desenvolver uma relação saudável com o filho”.
A psicóloga também detalha que é difícil para um filho conseguir assumir que está em uma relação tóxica com sua própria genitora. Segundo Rafaela, é comum que essas pessoas se culpem pela falta de afeto e pela instabilidade das relações dentro de casa em vez de enxergarem o real problema.
Para a psicóloga Tatiane Tereza, existem formas saudáveis de lidar com esse problema. A psicoterapia pode ser aliada nesse processo, segundo a profissional: “É necessário entender que quem muda para melhor será o filho, e não a mãe. O filho precisa perceber que ele pode sim sair dessa relação”.