Em 2021 o a conquista do sufrágio feminino no Brasil completa 87 anos. Hoje as mulheres correspondem a mais de 52,5% do eleitorado no país. Entretanto, a presença de mulheres em cargos representativos no Brasil é de 15%, bem abaixo da média mundial, que é de 23%. Das de 513 cadeiras na Câmara dos deputados, somente 77 são ocupadas por deputadas. No Senado são apenas 12 entre os 81 eleitos.
Para se ter uma ideia, segundo o ranking da Inter-Parliament Union, que analisa a participação política em parlamentos de 196 países, o Brasil está em 157º lugar, abaixo de nações onde mulheres têm poucos direitos
, como Afeganistão e Arábia Saudita.
Apesar do pequeno número de eleitas, é possível observar que o número de candidaturas vem crescendo, sobretudo quando se tratam de grupos minoritários. As candidaturas de mulheres indígenas passaram de 432 para 695 candidaturas na última eleição. As candidaturas de travestis e mulheres trans também cresceram, passando de 82 para 294 candidaturas no último pleito. Já as mulheres pretas passaram de 12.331 para 19.223 candidaturas.
Representatividade feminina
A coordenadora do projeto Emancipa Mulher, Joanna Burigo, explica que a pouca participação feminina é resultado da cultura machista brasileira. “O Brasil é o país mais perigoso para ser mulher no mundo e bastante dessa disparidade é resultado de uma cultura machista. Parte de reverter essa cultura é tentar incentivar a participação política”, diz.
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Na eleição de 2018 houve um pequeno aumento no número de mulheres no legislativo brasileiro, quando se passou de 11 para 15% no percentual de mulheres no Congresso Nacional. Joanna aponta que o aumento de mulheres na política é uma mudança de pensamento do eleitorado.
“Estamos vivendo uma era importante de representatividade e pautas identitárias. Por mais que o debate tenha sido conturbado, acabou entrando para todo o público. Mesmo quem não estuda sobre estudos de gênero, sabe a importância da representatividade, não só na política, mas na publicidade e TV. É um debate que existe e isso foi um dos motivadores”, aponta.
Contudo, o maior número de mulheres na política não representa necessariamente algo positivo relacionado a políticas públicas voltadas para mulheres. Conforme explica a cientista política e co-fundadora d’A Tenda das Candidatas, Hannah Maruci Aflalo, o crescimento de mulheres ligadas à direita e ao conservadorismo muito se deve ao fenômeno Bolsonaro e das fake news. “Isso ajudou o movimento conservador a se estabelecer e dificultar a entrada de leis voltadas para pautas feministas”, diz.
Além disso, Hannah explica que uma lei eleitoral de 2018 fez com que mais mulheres surgissem como vice ou como candidatas. “Essa lei, que segue a argumentação da política de cotas das mulheres, diz que 30% do financiamento de campanha deve ir para as mulheres. Mas não ficou explícito como usar, era uma forma dos partidos direcionarem o dinheiro para os homens, mas entrando na cota que eles tinham que cumprir”, afirma.
Mesmo assim, Hannah avalia como positivo a participação das mulheres como vices. “Seria melhor se elas tivessem mais poder, fossem a cabeça da chapa. Um problema disso também, olhando para a câmara dos deputados, esses 30% deveriam incentivar a participação de mulheres na política e aumentar o número de mulheres eleitas e a gente não viu isso”.
A advogada e co-criadora da Tenda das Candidatas, Laura Astrolábio diz que o aumento também se deve à ascensão dos partidos conservadores. “Por isso, a questão da representação política deve ser pensada considerando não apenas a política de presença, mas a representação de ideias e interesses combinada com ela”, declara.
O que esperar do futuro?
Para Laura, é necessário ter políticas públicas para diminuir as desigualdades para que isso possa refletir na participação política. “Acredito que o cenário não vai mudar de forma satisfatória e necessária sem políticas públicas eficazes no combate à desigualdade de gênero e raça na política, sem que os partidos revejam essa cultura de não apoiar mulheres em suas candidaturas e sem um combate à violência política de gênero e raça”, salienta.
Ela também aponta que a política deve se voltar para o bem-estar social e o futuro da política brasileira precisa passar pelo combate ao neofascismo e à necropolítica. "Isso para que tenhamos em vista um cenário que nos possibilite voltar a sonhar com o bem-estar social, que é o mínimo que um Estado democrático de direito precisa para garantir um de seus maiores princípios, o da dignidade da pessoa humana”, finaliza.