Julina Caribé, de 41 anos, sempre teve o sonho da materninade inspirado pela sua própria mãe. A advogada de formação e analista de relações internacionais trabalhou 14 anos em órgão público e decidiu, em 2015, mudar o estilo de vida e profissão para tentar, de fato, engravidar.
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A agora coach sabia que poderia ser uma tarefa complicada pois sofria de endometriose desde os 25 anos. Com o passar do tempo e sem conseguir engravidar de forma natural, começou um tratamento para fertilização in vitro. Mas tudo teve ser interrompido por causa da pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2).
Se para Juliana a idade já era um fator determinante para buscar um tratamento, para Ana*, essa opção veio muito mais cedo. Aos 28 anos ela começou o processo após descobrir que o marido não tinha espermatozoides o suficiente para que ela pudesse engravidar.
Ela deu início aos exames em novembro do ano passado e só esse ano conseguiu recolher os óvulos. E aí veio a pandemia e mais um sonho adiado.
Para as duas mulheres, interromper o tratamento para engravidar foi uma questão de saúde e também financeira. Juliana assume que é difícil lidar com a ansiedade, principalmente por causa da idade.
"Minha primeira implantação foi há mais de 2 anos, com os melhores embriões e não vingou. De lá pra cá, descobri um problema na tireoide e uma piora significativa na endometriose. Após esses tratamentos, achei que enfim estaria liberada para tentar novamente, mas veio o coronavírus. A sensação é a de que sempre existe uma barreira para a minha maternidade", desabafa.
Mas Juliana faz questão de ressaltar que o sonho de ser mãe foi apenas adiado, não abandonado. "Tenho fé de que um dos 3 embriões que tenho congelados vinguem e eu possa comemorar o maior sonho da minha vida: ser uma mãe tão incrível e amorosa como foi a minha para mim. Estou preparada e sei que o melhor acontecerá", diz a coach, que ainda comenta que não conseguiria em meio a tanta incerteza com um novo vírus seguir um procedimeto "tão caro e que mexe tanto com as emoções".
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Ana tem a idade a seu favor e preferiu também esperar para seguir com o tratamento. "Decidimos aguardar passar esse período da pandemia por não se saber se o vírus interfere na gestação, se passa pela placenta. Até porque todo o processo é caro, então precisam fazer com segurança", diz a tentante.
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Ainda assim, o sentimento é de dor. "Ficamos frustrados porque foram meses de preparação, exames, consultas e nos 45 do segundo tempo, quando já estava tudo bem avançado veio a pandemia. A última vez que fomos à clínica, já estávamos com dificuldade por causa do transporte público que só podia se tivesse comprovação de trabalho essencial", comenta Ana, que mora no Rio de Janeiro.
O melhor é esperar
De acordo com os médicos Maria Cecília Erthal, diretora-médica do Vida - Centro de Fertilidade e especialista em reprodução humana assistida - e Paulo Gallo, também diretor-médico do centro, que acompanham Juliana e Ana, é melhor, para quem pode, é esperar para finalizar o tratamento.
"Preocupados com essa situação, a Anvisa e as Sociedades Brasileiras de Reprodução Humana e Reprodução Assistida estão orientando que essas mulheres possam efetuar seu tratamento, estimulando a ovulação e captando os óvulos, porém não transferindo os embriões nesse momento", afirma Maria Cecília.
"Desta forma, podemos efetuar o congelamento dos óvulos ou embriões, o que permite manter as chances atuais de gestação, reservando a transferência dos embriões para um momento mais oportuno, após o controle da pandemia", completa a médica.
Esperar nem sempre é fácil. “Busco entender que a clínica e a médica que escolhi para esse processo estão fazendo o que é mais seguro para mim diante desse cenário e, além disso, faço muita meditação e oração para me manter em equilíbrio e diminuir a ansiedade de não saber quando poderei tentar novamente”, explica Juliana.
Ana também tem se apegado à religião para superar o momento. “A ansiedade estava a mil desde o começo, agora está tudo mais calmo. Espero o tempo de Deus, sabendo que os tempos são difíceis e queremos o melhor para o nosso neném. Rezando para acabar isso logo para finalizar o processo”, completa.
Segundo os médicos da clínica carioca, ainda não há uma data ou uma previsão considerada segurada para retomada dos procedimentos e implantação de óvulos ou embriões.
Já estou grávida, e agora?
Já a mulher que está grávida nesse momento - por uma gestação assistida ou natural - deve redobrar cuidados.
"O isolamento é a principal recomendação, mas também indicamos aqueles cuidados que todos estão tendo que é a lavagem das mãos a cada uma hora, usar álcool em gel com bastante flexibilidade, a limpeza da casa (das superfícies, do chão, usando água sanitária). Se for à rua tem que usar máscara, o tempo todo tem que ter esses cuidados básicos, para diminuir as chances dela entrar em contato com o vírus”, lista Maria Cecília.
Alguns desses cuidados ainda devem ser mantidos mesmo no pós-pandemia para quem quer engravidar. "Para as mulheres que vão começar seu tratamento após a pandemia, esses cuidados já não são tão rígidos, mas continuamos a incentivar o uso de máscara na rua, evitar o contato muito próximo, como beijar pessoas, dar as mãos, cumprimentar", fala a médica.
Maria Cecília aponta que, nesse futuro, o isolamento social não será mais a prioridade, mas todo o que estamos aprendendo sobre higiene deve ser mantido.