A fisioterapeuta e instrutora de ioga Roberta Perez , de 29 anos, teve sua vida transformada pelo câncer e atividade física, uma combinação que ainda pode parecer errada para muitas pessoas, porém que pode ajudar muitas pessoas que precisam enfrentar a doença.

Combinação câncer e atividade física ainda é um tabu, mas foi a diferença no tratamento de Roberta Perez; na foto, ela aparece com o marido após os dois primeiros quilômetros percorridos correndo depois de iniciar a quimioterapia
Reprodução/Instagram/vaipormim.oficial
Combinação câncer e atividade física ainda é um tabu, mas foi a diferença no tratamento de Roberta Perez; na foto, ela aparece com o marido após os dois primeiros quilômetros percorridos correndo depois de iniciar a quimioterapia

Aos 27 anos e recém-casada, Roberta descobriu um câncer de mama , cuja campanha de conscientização ocorre agora, nos meses de outubro. Em entevista ao Delas , ela contou como câncer e atividade física não precisam andar separados. Confira o relato:

“Quando eu era criança, era atleta, fazia ginástica olímpica, jogava handebol, mas quando entrei na faculdade comecei com uma vida sedentária. O jovem acha que nunca vai adoecer, e até o diagnóstico eu só fazia exercício quando queria emagrecer, algo puramente estético e nada constante.

Ao descobrir o câncer de mama , tive uma sensação muita desesperadora de olhar a finitude da vida. Senti um desespero muito grande de não ter conseguido fazer o que tinha planejado. O diagnóstico vem com um estigma errado de morte, e aí vem a sensação de ‘vou morrer e não fiz nada’.

As primeiras sessões de quimioterapia me derrubaram mais, e eu só conseguia pensar em menos uma. Eu pensava em tentar ficar o melhor possível para tentar acabar o tratamento. Nesse primeiro momento, eu ainda estava ‘sobrevivendo’.

Quando começou uma nova leva de quimioterapias, a médica disse que o mal-estar melhoraria, como os enjoos, e que a sensação seria como a de uma dor muscular, como a de academia.

Eu pensei que essa dor seria tranquila, algo que dava para aguentar. A primeira sessão de quimioterapia eu fiz em uma terça-feira. Não fiquei enjoada, nem se comparavam os sintomas, mas eu não aguentava de dor. Parecia uma dor no osso. No dia seguinte, falava para meu marido que estava muito incomodada, que não tinha posição. Foi terrível, então ele decidiu me levar em um parque.

Marido de Roberta foi o responsável por ela descobrir que câncer e atividade física não precisam estar separados
Reprodução/Instagram/vaipormim.oficial
Marido de Roberta foi o responsável por ela descobrir que câncer e atividade física não precisam estar separados

Começamos a caminhar, devagar, mas foi muito gostoso. O exercício mesmo foi bom. Quando cheguei em casa, passei o dia bem. Pensei ‘ah, isso não é coincidência, deve ter alguma coisa a ver’. Então fomos no parque na quinta-feira de novo para . Era como se meu corpo fosse uma coisa nova. Não sabia do que eu era capaz de fazer. Daí estava brincando com meu marido e pensei ‘Quer saber? Vou sair correndo’.

Eu corri dois quilômetros. Não foi algo pleno, foi muito difícil, e meu marido me deu uma super bronca. Ele disse que eu estava abusando, e não me levou mais no parque. Mas por dentro a sensação era maravilhosa. Descobri que era capaz de correr, uma sensação de que estava viva.

Quando fui na consulta na semana seguinte, meu marido me delatou. Ele contou que eu corri, mas a minha médica oncologista me parabenizou. Ela contou que câncer e atividade física podem andar juntos. Os exercícios são, sim, recomendados e ajudam a diminuir os efeitos colaterais. Daí mudou a chavinha.

Descobri que parte do tratamento é responsabilidade do médico, e a outra parte é por nossa conta. A atividade física e uma boa alimentação são as coisas que eu posso fazer por mim. Foi aí que comecei a correr e a frequentar a academia. Comecei a ser fitness doente.

Câncer e atividade física mudaram visão sobre a vida

Câncer e atividade física podem, sim, caminhar juntos, mas Roberta precisou parar os exercícios após cirurgias
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Câncer e atividade física podem, sim, caminhar juntos, mas Roberta precisou parar os exercícios após cirurgias

No final das contas, não fazia mais sentido emagrecer. Câncer e atividade física podem andar juntos, mas pela saúde. Percebi que eu não estava morta, e a partir desse momento eu não tive mais medo de morrer, eu tinha medo de não viver. No final das contas, passei meus 27 anos no piloto automático.

Finalizei as sessões de quimioterapia correndo 7 km. A dificuldade que eu tinha era um reflexo do que acontecia na minha vida. Foram cinco meses e oito dias, com a última sessão em 27 de dezembro de 2016.

Logo no começo de 2017 eu passei por uma mastectomia, e aí foi uma fase mais complicada. Eu optei por retirar as mamas e depois fazer a reconstrução, mas eu tive muito problema de cicatrização e emendei uma cirurgia na outra. Foram três ou quatro cirurgias só no começo do ano.

Câncer e atividade física podem andar juntos, mas nesse momento eu tive de parar. Tive de respeitar o corpo que estava sofrendo, e isso mexeu muito comigo. Desenvolvi depressão porque não queria aquela vida de sedentarismo de volta. A minha vida antiga não fazia mais sentido. Além de ser sedentária, eu tinha maus hábitos, como ficar bebendo no bar todo final de semana.

Eu queria mudar, mas fui obrigada a parar de treinar. Minha vida parou. Para melhorar, passei por acompanhamento com psicólogo e psiquiatra. E aí comecei a meditar. Depois eu conheci o pilates. Eu precisava me mexer, mas tinha dificuldade de movimento no braço esquerdo. Mas ainda não estava feliz só com isso, e junto da meditação comecei a fazer ioga.

A prática começou a me fazer bem não só fisicamente. A quimioterapia deixa a gente bem dura, além da mobilidade reduzida no braço, e com os exercícios eu fui ganhando alongamento, mas também melhorando da parte emocional e psicológica. Percebi que o ioga podia ser uma saída.

Durante a doença foi quando me senti mais viva

Corrida, academia e pilates foi como Roberta começou a unir tratamento de câncer e atividade física no dia a dia
Reprodução/Instagram/vaipormim.oficial
Corrida, academia e pilates foi como Roberta começou a unir tratamento de câncer e atividade física no dia a dia

Eu sempre corria careca, e toda vez eu chorava. As pessoas deviam achar que eu era louca, mas era uma sensação de que eu estava viva. Isso é totalmente emocional e psicológico, já que câncer e atividade física mexem com essas questões. Muitas vezes a gente subestima as nossas capacidades, mas durante minha doença foi quando eu me senti mais viva.

A confirmação da importância da atividade física foi quando eu tive de parar. Percebi como aquilo ia além do físico, como aquilo era meu combustível. E o mais importante, eu senti que eu também era responsável por parte da minha cura. Às vezes, a gente deixa muito para a responsabilidade dos médicos, dos exames, e não se empareda. Eu tinha o poder nas minhas mãos.

Eu costumo sempre dizer que o tratamento envolve varias partes, como as científicas, do medicamento, da cirurgia, só que a nossa cura interna – não necessariamente a cura da doença –, a nossa maneira de viver bem, está muito atrelada ao que a gente faz para a gente.

O tratamento é mutilador, agressivo, e se a gente não fizer algo de bom o pós do tratamento, o resultado, pode ser muito pior. Muitas pessoas ficam depressivas e não veem mais sentido na vida.

O exercício te dá a sensação de utilidade. Você é responsável pela sua saúde, assim como pelo seu adoecimento. A gente tem um poder muito grande nas mãos. Enquanto não cria essa consciência, o resultado final não vai ser 100%.

Mas é difícil. Muito difícil. A gente sente um cansaço sobrenatural, ainda mais quem é sedentário. Nessas dificuldades é que aprendemos nossas capacidades. E sempre vai ter uma atividade física para encaixar na nossa realidade: caminhada, ioga, pilates... há uma infinidade de opções. Eu acho que só depende de comprometimento."

Atualmente, Roberta já encerrou o tratamento contra o câncer e passa apenas por acompanhamento médico. Além de ter se tornado instrutora de ioga, ajuda mulheres que estão enfrentando a doença com sua página no Instagram @vaipormim.oficial, por onde conta suas experiências.

Cuidados gerais a quem está com câncer

Hoje, como instrutora de ioga, Roberta ajuda pacientes que querem unir tratamento de câncer e atividade física
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Hoje, como instrutora de ioga, Roberta ajuda pacientes que querem unir tratamento de câncer e atividade física

Como explica Rafael Kaliks, oncologista do Hospital Israelita Albert Einstein e diretor clínico do Instituto Oncoguia, não há problema em unir tratamento de câncer e atividade física, só é preciso ficar atenta a determinadas limitações, que variam de caso a caso, como o braço esquerdo de Roberta.

No caso de quem está liberado pelo médico a se exercitar, um estilo de vida ativo melhora a disposição, melhora a capacidade física, evita atrofiamento dos músculos, melhora a autoestima, evita a fadiga, entre outros benefícios.

“Quando se une tratamento de câncer e atividade física, deve se tomar cuidado redobrado com a exposição solar porque há risco de queimar a pele. A atividade também não deve levar a pessoa à exaustão, e esportes competitivos devem ser suspensos.”

O cuidado com a hidratação também deve ser redobrado, e a alimentação vai de acordo com a necessidade de casa pessoa. Em geral, o recomendado é manter uma dieta saudável e balanceada, evitando embutidos, excesso de carboidratos e carne vermelha. “Os excessos que são ruins”, alerta o especialista.

Sendo assim, tomando todos os cuidados necessários e ouvindo sempre especialistas de confiança, unir tratamento de câncer e atividade física pode gerar diversos benefícios.

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