Aos 74 anos, Geni Mariano Guimarães é um dos maiores nomes da Literatura afro-brasileira e a sétima homenageada da Olimpíada de Português. Professora, poeta e ficcionista, ela teve sua infância marcada pela literatura. “Eu comecei escrever desde sempre, publicando nos jornais da minha cidade meus textos, assim a minha infância foi marcada pela literatura”, relembra a escritora.
O primeiro livro, Terceiro filho, foi lançado em 1979. Na década de 1980, aproximou-se do Movimento negro e suas obras também passaram a discutir a cultura afro-brasileira. No total são 11 obras. A Obra Cor da Ternura, publicada em 1989, teve sua publicação traduzida para o Inglês, em 2013, pela Africa World Press.
Realizada pelo Itaú Social em parceria com o Ministério da Educação (MEC) e sob a coordenação técnica do CENPEC (Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária), a Olimpíada de Língua Portuguesa é realizada desde 2008 e busca contribuir para a melhoria do ensino e aprendizagem da leitura e escrita nas escolas públicas.
A homenagem aos escritores iniciou em 2019, na 6° edição das Olímpiadas, portanto, Geni é a segunda homenageada. A primeira foi a Conceição Evaristo . O processo de escolha das homenageadas levam em conta diversidade de gênero e de raça. Além de ser a sétima homenageada da Olimpíada de Português, Geni acumula prêmios como o Prêmio Adolfo Aizen e a Balada literária.
Literatura negra e romancista
O seu primeiro livro, Terceiro filho, foi lançado em 1979. “Como eu já tinha dois filhos, meu primeiro livro publicado teve como nome “Meu terceiro filho”, explica. A segunda publicação, Da flor o afeto, da pedra o protesto, em 1981. E a Balé das emoções - Barra Bonita: Ed. da Autora, publicado em 1993. Para publicar o seu primeiro livro, ela precisou vender um Fusca.
Após estas poesias, um conjunto de contos e literatura infantis foram sendo publicados, até o momento sendo um total de 11 obras. Os principais temas que marcam suas obras são o amor, a literatura negra, o racismo, os preconceitos e sobre a vontade de mudar estas desigualdades no mundo.
Suas primeiras referências literárias são Jorge Amado, Cecília Meireles e José Mauro de Vasconcelos, embora ela se incomodava com alguns estereótipos sobre a negritude que permeavam as obras. Seu contato com a literatura negra inicia assim que ela teve contato, nos anos 80, com o grupo Quilombhoje, composto por escritores como cuti e Osvaldo de Camargo, cujos encontros eram direcionados aos autores negros de São Paulo.
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Trajetória pessoal
Filha de Sebastiana Rosa de Oliveira e Benedito Mariano de Camargo, Geni é a décima primeira filha entre doze irmãos, dos quais conheceu apenas 9. Aos cinco anos, mudou-se para Barra Bonita, onde passou a frequentar a vida escolar.
Sempre com olhar afetuoso e positivo, Geni não olha a sua infância e a sua trajetória com sofrimento. Ela busca sempre focar nos pontos positivos, abordando sobre o privilégio de ter nascido em uma família maravilhosa. "Meus pais eram maravilhosos, as experiências que eu tive com a minha família foram maravilhosas, as coisas ruins ficaram para trás", relembra.
Nascida na área rural do município de São Manuel, interior de São Paulo, a escritora tinha um caminho de quase uma hora e meia para chegar à escola. Para complementar a renda, vendia maços de agrião colhidos pelo pai e dava aulas de português para suas colegas com um bom poder econômico, assim juntava dinheiro para o desejado “lanche de aliche” - um delicioso sanduíche de pão e sardinha.
Quando interrogada sobre suas experiências enquanto uma mulher negra, ela relembra que são muitos episódios de racismo durante a sua vida, mas também, um longo processo de aceitação e consciência racial. “Eu sempre quis viver, eu sempre vi a necessidade de fazer literatura negra, pois por muito tempo eu passei tijolos na perna porque eu queria ficar branca para ser mais aceita”, relembra.
A escritora relembra também que, recentemente, estava varrendo a calçada de sua casa quando uma senhora em um carro de luxo parou e perguntou se ela ainda tinha horários vagos para faxina. “Por ser negra e estar lavando a calçada de uma casa boa, eu só poderia ser faxineira”, comenta.
Viúva de Idevaldo Pereira Guimarães, pai de seus filhos Cristhian Leandro e Clesly Evandro, Geni conta que passou por uma depressão profunda anos após seu falecimento, em 2013. Durante sua adolescência em casa, o seu pai defendia um relacionamento interracial para “clarear” a família.
“O meu pai não queria que nós namorássemos homens negros, porque ele queria que clareássemos a família, mas eu me casei com um homem negro, pois eu sempre soube muito o que queria, então eu pude escolher”, aponta ela.
No tema de matrimônio, Geni aborda as dificuldades que as mulheres negras possuem em encontrar um amor romântico.
“Todo relacionamento é difícil, mas as mulheres negras se sentem mais inseguras por conta do racismo”, explica Geni.
Ciente de todo o reconhecimento que vem conquistando, Geni Guimarães compartilha que é muito grata e vive uma vida simples e comum. “É muito gostoso estar sendo reconhecida, não sou uma pessoa deslumbrada, ontem por exemplo, eu fui levar uma vizinha ao médico, hoje estou aqui em casa de pijama descansando, tenho uma vida comum”, finaliza a escritora.