Somente este ano foram noticiados diversos casos de agressão na escola ou creche no país. Em Boa Vista, capital de Roraima, um bebê de um ano voltou para casa com quase 15 mordidas pelo corpo . O mesmo aconteceu em uma creche de Rio Verde , Goiás. Em um episódio mais grave, bebês foram dopados com clonazepam , Rivotril, no interior de São Paulo.
A realidade é triste e preocupa. Diante de casos de agressão na escola , o que os pais podem fazer? Onde procurar ajuda e a quem recorrer? O primeiro passo é entender quem foi o responsável pela ação. É isso que vai direcionar qual caminho os responsáveis e a escola vão seguir.
“A agressão de um professor é muito diferente da de outra criança, dos pares, no caso, crianças da mesma faixa etária. Portanto, é fundamental tomar cuidado para não colocar ambas no mesmo nível. São situações que precisamos lidar de maneiras totalmente diferentes”, explica Deborah Moss, neuropsicóloga mestre em psicologia do desenvolvimento humano (USP) e especialista em comportamento infantil.
Segundo a profissional, é comum que entre crianças de dois ou três anos uma morda a outra, já que ainda têm dificuldades de manifestar os sentimentos. “Quem cuida dessas crianças, os responsáveis, são os mediadores dessas situações, então cabe a eles perceber que tem uma criança que bate e morde mais e ficar de olho para antecipar a reação dela”, fala.
Ao perceber que isso pode acontecer, é importante tirar a criança dessa situação e mostrar que há outras forma de agir e aquilo não é certo. “Já no caso dos mais velhos existem questões de bullying e essa situação é de responsabilidade da escola. Interceder faz parte do processo educacional, no caso, do respeito e cuidado com o próximo. Tudo isso pode servir de material de discussões na escola e de reflexões”, completa.
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No entanto, os casos de Roraima e Goiás vão além de um comportamento esperado para a idade. São ações que chegam a machucar outras crianças. Fernanda Beatriz Gil da Silva Lopes, promotora e coordenadora do Centro de Apoio Operacional da infância e Juventude e Idoso do Ministério Público de São Paulo, fala que, nessas situações, os pais podem fazer um boletim de ocorrência.
“Primeiramente será buscada uma medida protetiva, por exemplo, que seja providenciada uma maior vigilância da criança agressora para proteger a criança agredida. Havendo reincidência ou comprovada negligência da creche ou professor, os envolvidos podem ser responsabilizados administrativamente ou criminalmente”, explica a promotora.
Fernanda Lopes ainda explica o que é considerado maus tratos às crianças de acordo com o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Segundo ela, é crime expor a saúde mental ou física da pessoa que se tem sob guarda a perigos. Ou seja, professores, cuidadores ou qualquer outro profissional responsável pela criança pode cometer o crime.
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Antes de fazer o boletim de ocorrência, a promotora orienta acionar a escola. De acordo com ela, o MEC (Ministério da Educação) prevê um sistema de providências ou sanções que devem ser tomados diante desses casos. A ocorrência deve ser apurada e os responsáveis identificados. Se for o caso, seguirá para o sistema criminal e um promotor de justiça vai investigar.
No entanto, se os pais não encontrarem apoio da escola para investigar o caso, podem – e devem – recorrer ao conselho tutelar ou a uma delegacia para fazer um boletim de ocorrência. “Se for o caso, o Ministério Público vai investigar”, fala a promotora.
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Além dessas agressões físicas
aparentes, crianças podem ser vítimas de violência
psicóloga, verbal e até sexual. Porém, nem sempre verbalizam aos pais. “Dependendo da faixa etária, são muitos os casos em que não conseguem expressar sentimentos e, com medo, acabam se calando”, diz Deborah Moss.
A especialista explica que se for uma agressão que causa dor, aquela que elas realmente sentem no próprio corpo, conseguem entender melhor e pode ser que contem aos pais. No entanto, situações de abuso sexual, por exemplo, onde não há dor, ela não entende que é uma agressão, não entende que aquilo não pode acontecer.
“Se alguém passa a mão no corpo dela ou ela passa a mão no corpo de um adulto, pode não entender que aquilo é algo que não poderia acontecer. Nesses casos, acaba sem saber que é errado e, como não causa dor, pode pensar que é uma demonstração de carinho como um abraço, um beijo ou como um cafuné."
A psicóloga fala que alguns sinais no comportamento dos pequenos podem ajudar os adultos a perceber que algo de errado está acontecendo. Segundo ela, é comum que as crianças passem a apresentar apatia ou agressividade exacerbada em alguns momentos. “Se não estiver acontecendo nada no ambiente familiar e não ocorreu nenhuma mudança que poderia justificar a atitude, é importante entrar em contato com a escola para tentar entender”, orienta.
“É importante deixar a escola de sobreaviso e tentar buscar estratégias para que essa criança tenha recursos para falar de si mesma, mas de uma maneira em que ela nem perceba que esteja falando dela”, completa. Sendo assim, Deborah diz que pode ser uma boa alternativa usar de recursos lúdicos, com brincadeiras que tenham alguma situação de violência ou narrativas que contem histórias sobre temas que possam suscitar essa criança a conseguir expressar o que esteja incomodando.
Nem sempre é possível evitar a violência contra a criança em ambiente escolar. No entanto, deixar o canal de comunicação aberto e estar sempre atento aos sinais que seu filho dá são caminhos importantes para ter conhecimento e intervir na situação o quanto antes.
Para entender de que forma as instituições lidam com casos de agressão na escola , seja por parte de alunos ou funcionários, o Delas contatou dois colégios tradicionais da cidade de São Paulo. Porém, nenhum quis comentar o tema.