Como já contei aqui antes, após quase 40 anos voltei a estudar. Portadora de diploma de nível superior, consegui sem nenhuma dificuldade me matricular em um novo curso de graduação. Tudo feito pelo WhatsApp. Incluindo a negociação de preço, que começou em 790 reais, mas que sem nenhum esforço de minha parte chegou a 318 reais mensais – desconto de 60%, que a partir do segundo semestre será de 50%, conforme acordo que fechei com uma atendente via rede social. Detalhe importantíssimo: eu e meus colegas, cerca de 35 pessoas, nos matriculamos para estudar no período da manhã na modalidade presencial. E foi aí que surgiu a primeira grande decepção.
Na véspera do início das aulas tivemos acesso à grade horária do curso – Serviço Social, matutino e presencial. Das seis disciplinas que temos no primeiro semestre, apenas uma delas é de fato presencial. De acordo com o conceito deturpado praticado pela faculdade em questão, eles consideram aula presencial aquelas que são dadas por videoconferência, em tempo real. Temos segundo essa definição esdrúxula duas disciplinas na modalidade presencial. Uma grande história da carochinha.
Quando soube disso, fui à faculdade disposta a cancelar minha matrícula. Não fazia sentido para mim ter aulas gravadas, conteúdo novo e extenso, sem possibilidade de tirar dúvidas de forma rápida com um professor. Ao chegar no campus da instituição me deparei com vida, com um grupo variado e plural de pessoas, me encantei e permaneci matriculada. Conhecer gente jovem, gente madura, batalhadora e firme no propósito de realizar o sonho da universidade me fez ficar. Mesmo uma vez por semana, quando temos a única aula presencial de verdade, encontrar e falar com o pessoal da turma é para mim um grande aprendizado de vida.
Nos últimos dias, entretanto, a desilusão do grupo com as aulas à distância, a dificuldade no aprendizado e também no meio virtual despertou em mim e parte da turma uma profunda indignação.
Quando comparadas com as faculdades privadas melhor colocadas em rankings de instituições de ensino superior em São Paulo, como PUC-SP, FGV, Mackenzie e Insper, o preço das chamadas faculdades populares é baixo, mas ainda é alto e desproporcional aos salários e renda per capita das famílias que pagam o boleto todos os meses. Sem levar em conta os beneficiados pelo Prouni, que têm a mensalidade paga pelo governo federal.
Chegando perto do final do semestre e com apenas dez alunos na turma, que poderíamos chamar de sobreviventes, a conta aumenta a cada prova substitutiva – aquela que é feita quando o aluno não atinge a média e é oferecida a oportunidade de refazer o exame. Sem ter a quem recorrer para tirar dúvidas ou um retorno sobre erros cometidos na avaliação anterior, cada aluno deve pagar 114,67 reais por substitutiva. Imagine o peso deste valor na contabilidade de cada família em busca de realizar o sonho do diploma de nível superior.
O pesadelo vai ficando ainda pior após a prova substituitiva e mais uma nota abaixo da média. Pelas regras da faculdade, os alunos podem seguir adiante, para outros semestres, levando consigo até cinco dependências. Para isso, no entanto, o aluno tem que desembolsar 951,90 reais por disciplina.
Essa realidade, creio, não é diferente em outras Instituições de Ensino Superior (IES) Brasil afora. Minha vivência nesta faculdade serve de amostragem do que é o sistema brasileiro de ensino superior privado e que deve estar sob escrutínio e análise do ministério da Educação. A faculdade onde eu e minha turma de Serviço Social estudamos tem mais de 50 anos de existência e formou ótimos profissionais. Foi vendida a um fundo de investimento, depois a outro, e aos poucos vem se transformando numa plataforma de conteúdo na qual cada um se vira como pode. Menos custo com menos professores em sala de aula, ganhando salários menores e aluno recebendo uma educação de baixíssima qualidade qualidade. Uma máquina de dinheiro a custo bem baixo para os investidores.
O próximo capítulo desta novela, já visto por alunos de outros semestres da mesma faculdade, é a turma de Serviço Social do matutino presencial ser transferida compulsoriamente para o período noturno, onde as turmas chegam a ter 80 alunos por sala de aula.
Vejo sonhos sendo destruídos dia após dia.