Na sexta-feira (14), uma discussão sobre fetiches viralizou nas redes sociais. Em seu perfil, uma internauta relatou estar surpresa com a existência de um fetiche em cuspe. Como resposta, uma seguidora afirmou que esse desejo seria “adquirido pela pornografia.” Em poucos minutos, o termo ‘fetiche’ chegou aos tópicos mais discutidos do Twitter.
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Mas, ao contrário do afirmado pelo internauta, especialistas da área da sexologia e psicologia consultados pelo iG Delas asseguram que ter um fetiche não está diretamente relacionado ao consumo de conteúdo pornográfico.
“Os fetiches são considerados normais dentro da sexologia, desde que haja consentimento das partes envolvidas e que não ponha em risco a vida de quem está envolvido, assim como também não cause constrangimento ou humilhação que se configure violência ou assédio sexual”, afirma a sexóloga e CEO da INTT Cosméticos, Stephanie Seitz.
E o que é, de fato, um fetiche? Essa expressão é derivada da palavra francesa ‘fetiché’, que veio do termo em português ‘feitiço’ - o vocábulo surgiu no século XVIII para representar a visão dos colonizadores franceses aos objetos culturais e religiosos que eram adorados pelas populações locais das colônias africanas.
Tais objetos eram chamados de ‘fétiches’ pelos colonos, e após alguns anos, essa palavra tornou-se um termo genérico para quaisquer objetos de adoração em uma cultura.
Na psicologia, o fetiche tem conotação sexual e representa o uso de objetos e partes do corpo em situação erótica, “causando prazer, despertando comportamentos ousados, podendo levar ao clímax e mesmo a situações de submissão e dominação”, complementa Seitz.
“É importante lembrar que o fetiche é absolutamente natural. Ele está associado a uma atração erótica muito forte por algumas peças, algumas partes do corpo ou algumas ações, como uma pegada ou um puxão de cabelo, por exemplo”, explica o sexólogo Jeová Batista.
Segundo o especialista, a origem dessas atrações está datada desde a infância - cada experiência, ao longo da vida, molda o desejo de um indivíduo até a idade adulta. “A dinâmica da própria vida vai favorecer com que a gente desenvolva determinados fetiches”, conta o psicólogo.
As opções são diversas: das mais conhecidos, como sexo anal, menage, pés, mãos, látex, BDSM (Bondage, Disciplina, Dominação, Submissão, Sadismo e Masoquismo) e exibicionismo, até as mais inusitadas, como tênis, axilas, piercings, ‘money slaves’ (quem sente prazer em pagar as contas de alguém) e cuckolding (ver o parceiro com outro).
“Encontro muito aqui no consultório pessoas que têm uma atração muito grande por mãos, por pés, por determinadas peças de roupa. Já conheci até um homem que tinha fetiche por rendas, e sugeri que ele começasse a comprar cuecas de renda. Ele ficou super feliz”, relata Jeová.
A pesquisa ‘Censo do Sexo’, realizada pela empresa Pantynova, ilustra um pouco dos fetiches dos brasileiros durante o sexo: 51% dos entrevistados afirmaram que a principal fantasia na ‘hora H’ é o sexo a três. Em segundo e terceiro lugar, ficaram o sexo em público e o BDSM.
“Vejo muito o uso de fantasias de colegial, enfermeira, marinheira, mulher-gato, etc. Pessoas que buscam relacionamento a três. Uso de brinquedinhos eróticos para o parceiro participar ou acompanhar. E tem aqueles que usam a dominação, com uso de algemas, olhos vendados, chicote”, relata Seitz.
Tabu?
Por mais que esses desejos estejam mais presentes dentro da sociedade, eles ainda são tabu para muitas pessoas, que deixam de expressá-los, seja por vergonha, falta de informação ou medo. Uma pesquisa conduzida pelo psicólogo Justin Lehmiller atestou que 79% das pessoas disseram que gostariam de vivenciar suas fantasias e desejos no sexo, mas apenas 23% realmente tentaram vivenciá-las.
Os especialistas refletem que a existência de um fetiche não deve ser fonte de vergonha para nenhum indivíduo. Seitz explica que os fetiches são comportamentos saudáveis e até ferramentas para tirar o sexo da rotina. Não é à toa, segundo a CEO, que as lojas eróticas estão cada vez mais populares. “As pessoas estão redescobrindo o prazer e a liberdade de viverem suas fantasias sexuais.”
Em um relacionamento, no entanto, pode parecer mais difícil lidar com desejos e atrações inusitadas sem afastar (ou até assustar) o parceiro. O problema, na maioria das vezes, é a falta de diálogo.
“O assunto sexo é cercado de tabus e preocupações. E nessa minha caminhada, tanto no consultório quanto em palestras e eventos, as pessoas sempre se preocupam. Eu ouço "Poxa, como é que vou falar para o meu parceiro sobre isso?” É necessário abrir um canal, abrir uma janela de comunicação, de maneira que eu possa falar sem uma preocupação de ser julgado”, aconselha Jeová.
A melhor maneira de abordar esse assunto é de forma leve e descontraída, sem pressão ou discussão entre ambos. Se abrir com o parceiro de forma gradual pode fazê-lo entender os fetiches de forma mais compreensiva.
Quando apenas o diálogo não é mais suficiente, a terapia sexual é uma boa opção para quem deseja resolver esse problema. Com a intermediação de um psicólogo, fica mais fácil entender as nuances das atrações e desejos no sexo.
O fetiche também vira um problema quando a compulsão de realizar estes momentos eróticos se torna um vício incontrolável.
Jeová exemplifica: “Se a pessoa não estiver usando uma meia preta ou uma cueca azul, não vai rolar sexo. Ou quando minha parceira está com uma lingerie branca, e se não tiver isso, não há tesão, eu broxo e a coisa não funciona. Então, não podemos de maneira alguma tornar nosso fetiche como base da relação.”
E como isso pode ser tratado? “É preciso que a pessoa busque ajuda médica e terapêutica, para buscar solucionar estes transtornos sexuais, antes que o problema se torne mais grave, afetando outras pessoas e vitimando-as” finaliza Seitz.