A Copa do Mundo segue a todo vapor, mas nem tudo é festa para quem não gosta de futebol e precisa lidar com um parceiro fanático. Para o psicólogo Jacob Pinheiro Goldberg, neste período o machismo no futebol fica ainda mais em evidência e, justamente por isso, é comum precenciarmos até brigas entre casais ou ouvirmos mulheres dizendo que detestam o esporte.
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“Por mais que existam mulheres que acompanhem, nós sabemos que o futebol, tanto historicamente quanto por todas as suas características, é um esporte em que os homens têm um espaço maior, com o machismo no futebol enraizado”, afirma o especialista, reforçando que pode ser justamente esse o fator que afasta algumas mulheres da torcida.
Para ele, muitas mulheres deixam de assistir aos jogos e acabam criando certa repulsa pelo esporte por causa das atitudes de seus parceiros e de outros homens, que fazem questão de mostrar que entendem mais do assunto e, com isso, causam conflitos desnecessários.
“O futebol se transformou em um espetáculo para homens. Quando você vê algumas mulheres nas torcidas, é como se elas estivessem de penetra na festa de alguém. O clima é de extrema agressividade, e nós temos todos os elementos em torno do futebol para ver um divisor entre os gêneros”, comenta Goldberg, que atende atletas em seu consultório e se diz chocado com as histórias que escuta diariamente e remetem ao machismo no futebol.
“Esses dias, atendi um paciente que me contou que na Tailândia é praticamente proibido as mulheres falarem sobre os jogos e irem aos estádios. Isso é uma obsessão que fica na fronteira da misoginia. É por causa dessa cultura machista que muitas moças sofrem ao terem de lidar com os namorados ou maridos que gostam muito dos campeonatos”, relata o especialista.
Machismo no futebol e as consequências nos relacionamentos
No Brasil, embora não existam “proibições” para o sexo feminino com relação ao futebol, o comportamento de alguns homens não deixa de incomodar muitas mulheres. Quando isso vira um problema dentro de um relacionamento amoroso, no entanto, o psicólogo afirma que é ainda mais importante encontrar limites para esse fanatismo.
Larissa Barros, de 22 anos, namora Jorge Souza há três anos e meio e conta que seu parceiro, torcedor do São Paulo, não deixa de ver um jogo do time do coração. O rapaz acompanha as notícias do clube todos os dias e já chegou a deixar a namorada chateada com o exagero, mas nada como uma boa conversa para acalmar os ânimos e deixar tudo mais saudável.
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“Ele espera acabar o jogo para sair ou fazer algo. O domingo de manhã é reservado para o futebol, que se estende no bar, à tarde, para continuar discutindo sobre os jogos. Pedi para ele dar uma segurada e até que isso melhorou bastante”, afirma a jovem, que admite não saber o nome dos jogadores e diz torcer apenas “por tabela”. “Entendo tanto de futebol que sou capaz de escalar o Rogério Ceni”, brinca.
De acordo com o especialista, Larissa tomou a decisão certa ao conversar com o namorado sobre o que a incomodava. Segundo ele, os casais devem resolver seus problemas com o diálogo, na base da negociação.
Não parece, mas é machismo
Goldberg acredita ainda que algumas atitudes que homens têm quando estão assistindo aos jogos de futebol deixam muito claro o quanto o machismo no futebol está presente em assuntos relacionados ao esporte. Essas situações deveriam ser combatidas, mas são tão comuns que não surpreendem mais ninguém.
“É aquele ritual de o pai, os filhos homens, o cunhado e os amigos ficarem na sala tomando cerveja, como se estivessem celebrando uma missa da ala masculina, em frente à TV, criticando o que a mulher diz ou mandando ela calar e servir. E isso precisa mudar”, afirma.
Para ele, isso acontece porque a maioria das mulheres não é inserida neste contexto desde a infância e, por conta disso, na fase adulta, demonstram menos conhecimento acerca das regras do mundo da bola. “O homem não pode tomar uma posição egoísta e achar que ele é o único conhecedor do alfabeto futebolístico. Cabe a ele dividir isso com a parceira para criar interesse em ambos”, defende.
Aos que resolvem assistir aos jogos fora de casa, em bares ou até mesmo em estádios, Goldberg diz que é preciso ter uma relação com muito diálogo para evitar brigas conjugais após o futebol. Na maioria das vezes, na hora de torcer, há uma explosão de sentimentos que trazem à tona, minutos depois, conflitos que haviam sido colocados "embaixo do tapete", como a disputa de poder na relação.
“No caso de mulheres que se sentem trocadas pelo jogo, isso geralmente é cobrado depois e até o barulho de uma comemoração passa a estressar”, afirma o especialista, reforçando que as mulheres precisam se posicionar ainda mais contra o machismo no futebol, algo que pode passar como uma situação banal. Sem diálogo e concessões das duas partes, a tendêcia é o casal se afastar aos poucos e fragilizar a relação.
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“Elas não devem aceitar piadas humilhantes, como se fossem incompetentes ou incapazes de compreender um jogo de futebol. Os homens precisam superar a reserva mental para quebrar esse tabu de que bola é só para meninos. As mulheres podem, sim, participar da festa e do espetáculo. Por causa dessas barreiras criadas pelo machismo no futebol , muitas acham que não gostam do esporte, mas podem mudar de ideia com uma aproximação", finaliza Goldberg.