Quem nunca ouviu falar de instinto materno? Ao longo de séculos, o papel da mãe foi moldado pelas estruturas sociais dominantes, em que gestar e cuidar dos filhos eram tarefas atribuídas exclusivamente às mulheres. Nos tempos atuais, muitas mães se posicionam contra a romantização da maternidade, buscando desmistificar os estigmas que cercam o tema.
Um problema relacionado à ideia do instinto materno é a crença de que, se essa condição existe, as mulheres devem buscar necessariamente a maternidade para alcançar a plenitude - isso inclui a pressão para alcançar a perfeição nesse papel.
Surge então a problemática da maternidade compulsória, definida como o resultado de práticas socioculturais que levam as mulheres a se tornarem ou desejarem ser mães, muitas vezes sem que isso represente verdadeiramente uma escolha pessoal.
Um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) revela que 97% das mães relatam sentir-se sobrecarregadas quase todos os dias da semana. A pesquisa "De Mãe em Mãe", que entrevistou 800 voluntárias, também indica que 94% delas se sentem desgastadas por exercer a função.
Os motivos por trás dessas queixas estão relacionados ao excesso de demandas que as mães precisam lidar diariamente. Esse fenômeno pode ser associado à chamada 'tripla jornada', na qual as mulheres enfrentam exigências simultâneas relacionadas aos cuidados dos filhos, da casa e do trabalho.
Para Carolina Izidro, mãe de Sócrates, estudante de serviço social, e ativista da maternidade real, o instinto materno é um mito criado no âmbito social que tende a frustrar a mãe após o choque de realidade.
"O instinto materno é muito falado como se fosse um sentido a mais dado a nós, somente pelo fato de termos nascido do sexo feminino, e também pela glamurização da maternidade, o pensamento de que é algo que vem no combo de quando você vira mãe e aparece lá do nada. Vende-se muito o slogan 'quando o bebê nasce, nasce uma mãe', um discurso totalmente pífio. O correto seria: 'Nasce uma mãe, nasce uma culpa'", reflete.
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Amor incondicional
Os nove meses que antecedem o nascimento do bebê são um momento único, em que a idealização da maternidade é mais presente que a realidade em si. Nesse contexto, a pessoa vive um período de conexão com o feto, a preparação para recebê-lo, mas que, não necessariamente, se traduz em um amor incondicional imediato. Esse sentimento, pode, inclusive, nunca chegar.
Diante disso, não é incomum mães relatarem que demoraram um certo tempo para começarem a amar os filhos. Para Carolina Izidro, mãe de Sócrates, o amor incondicional é mais uma "balela inventada".
Além disso, a ativista reflete que o tema é usado para coagir mulheres a experimentarem a maternidade. "A mulher pode amar 'até doer' um amigo, um irmão, um animalzinho, uma profissão, amor é tudo que te faz seguir em frente por algo ou alguém. Isso é mais uma coisa vendida pela sociedade, que faz as mulheres acharem que só serão completas depois que virarem mães".
Amor igual entre os filhos
Quem nunca presenciou discussão de irmãos sobre quem é o filho preferido da mãe? Por mais que o assunto seja tratado de forma muitas vezes brincalhona, é importante ressaltar que a relação da mãe com cada filho é singular e diferenciada, podendo, sim, fazer com que a mãe tenha mais afinidade por um deles.
"Os pais desenvolvem um vínculo único com cada filho, baseado nas interações e cuidados compartilhados ao longo do tempo. O amor é expresso de maneiras diferentes, adaptando-se às necessidades individuais de cada criança", destaca Greice Potrick, especialista em psicologia positivista.
Gestação é um momento lindo
Entre várias gerações, circula a ideia de que a gestação é um momento incrível, lindo e encantador. A sensação até pode ser verdadeira para algumas mulheres, mas de maneira alguma se configura como regra.
É necessário levar em conta que, durante os meses em que o feto está na barriga, a mulher passa por diversos processos hormonais e fisiológicos que, por muitas vezes, fazem com que o período seja desconfortável e nada encantador.
"É importante reconhecer que a experiência da gravidez pode variar de mulher para mulher e até mesmo para uma mesma mulher em diferentes gestações.
Cada mulher vivencia a gestação de maneira única, influenciada por uma variedade de fatores, incluindo sua saúde física e emocional, suporte social, contexto cultural e experiências prévias. Para algumas mulheres, a gravidez pode ser uma experiência positiva e gratificante, enquanto para outras pode ser desafiadora e estressante", destaca a psicologa Greice Potrick.
A profissional também chama atenção para o fato de que nem todas as mulheres se sentem instantaneamente conectadas ou emocionalmente preparadas para a maternidade durante a gravidez, ou até mesmo depois disso, e é importante reconhecer e validar essa variedade de sentimentos.
"As mulheres frequentemente enfrentam pressões sociais e expectativas culturais em relação à maternidade, como a ideia de que deveriam se sentir radiantes e sempre felizes, e isso pode não acontecer. Cada ser humano é único em suas experiências e vivências, é fundamental reconhecer a complexidade e a diversidade disso", completa Greice Potrick.
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