O terrorismo não tem mais a mesma cara. Nos últimos anos, por trás dos lenços pretos que escondem a identidade dos terroristas, o que se vê são dois olhos femininos bem marcados por maquiagem.
A participação das mulheres em atentados suicidas vem crescendo em ritmo vertiginoso. Segundo dados do exército norte-americano, em 2007, sete atentados suicidas foram cometidos por mulheres. Em 2008, esse número subiu para 36 ataques.
Em janeiro, a iraquiana Samira Ahmed Jassim, de 51 anos, foi presa acusada de recrutar 80 mulheres-bomba pelo país. Jassim, mãe de seis filhos, admitiu ter recrutado pelo menos 28. Em entrevista à Associated Press, ela revelou que os sunitas organizavam violações em massa de mulheres para que ela depois tivesse facilidade na hora de persuadi-las. Não é preciso lembrar que em países como o Iraque mulheres estupradas são desprezadas pela família e pela sociedade.
Em Israel e na Palestina, as histórias se repetem. Em 2002, Wafa Idris, paramédica, divorciada, ficou famosa como a primeira mulher-bomba palestina. Ela tinha 28 anos. Na explosão, uma pessoa morreu e 100 ficaram feridas. O que exatamente levou essa e outras mulheres a se suicidarem, e que a cada ano faz delas um número maior de vítimas, é uma incógnita, principalmente para quem tenta entender com olhos ocidentais.
O jornalista Nahum Sirotsky
, correspondente do iG em Israel, vive de perto essa realidade e escreveu sobre o assunto. Veja a opinião dele:
As Guerreiras do Islã
por Nahum Sirotsky
A população mundial é estimada em sete bilhões, com ligeira maioria de homens. Com relação às religiões, os cristãos somam mais de dois bilhões. Agnósticos e ateus representam em média um bilhão e 200 milhões.
O islamismo é a fé de mais de um bilhão e meio de pessoas.
A fé muçulmana também é a que mais cresce e se expande na atualidade. O Islã se autoqualifica como a única religião verdadeira e o Corão, seu livro sagrado, como Último Testamento de Deus.
A jihad é a ação que se comete para defender a fé islâmica daqueles que a rejeitam.
O suicida, o mártir, o indivíduo que assume o sacrifício da própria vida terrestre na jihad, acredita -- ou é convencido de -- que passará diretamente ao Paraíso
, que, para certas tradições é representado como uma eternidade de abundâncias. Esse Paraíso exclusivo dos mártires da fé, no entanto, é direito reservado apenas aos homens.
Segundo os estudiosos, o extremismo está no bojo da fé islâmica porque a concepção exclusivista da verdade salvadora implica na obrigação de oferecê-la a toda a humanidade.
Ou seja, não é suficiente explicar a motivação desses homens apenas pela lavagem cerebral . Importa, sim, convencê-los de que esse suicídio é um ato sagrado , isso é que tem se revelado verdadeiramente irresistível.
A lavagem cerebral, expressão antiga, no século passado chegou a convencer homens de extrema inteligência a denunciarem companheiros por crimes inexistentes. E até a se autodenunciarem, convencidos de que salvavam ideais essenciais à geração do mundo novo.
Não há precedentes, no entanto, para a transformação do indivíduo numa bomba que irá reduzi-lo a pedaços irreconhecíveis.
A incapacidade de compreender tal gesto é que sustenta a convicção de que toda a vigilância é necessária para impedir o holocausto que o acesso, cada vez mais fácil, às armas mais mortíferas parece anunciar.
E, ainda, como explicar a mulher-bomba , que não tem a promessa da recompensa do Paraíso reservado aos homens?
Acontece que mesmo numa época em que é forte a presença feminina nas forças armadas, ainda sobrevivem desinformados preconceitos sobre o chamado sexo fraco.
Nos Vedas, poema indu de 3.500 anos antes de Cristo, conta-se a história de Vishpla, guerreira que perde a perna em uma batalha, coloca uma prótese e volta à luta. A Bíblia destaca Débora, guerreira na conquista de Canaã há 1250 anos antes de Cristo. Um Papa tentou proibir, sem sucesso, a participação de mulheres na III Cruzada. A lista de guerreiras em todas as épocas e circunstâncias exige centenas de páginas.
Teorizam sobre a mulher guerreira santa de hoje, suicidas, como sendo motivadas pelo desejo de vingarem perdas de familiares . O que se verifica, contudo, são razões diversas, muito semelhantes às que inspiram os homens: a defesa da pureza da fé . O que escrevi dos homens cabe também a elas.
No número crescente de mulheres muçulmanas de todas as nacionalidades cobrindo a cabeça com uma espécie de touca há o sinal: somos praticantes. É uma forma de se diferenciarem das não-muçulmanas. Um gesto de afirmação de orgulho nacional-religioso. Um véu de separação.
Em torno das que assumem o martírio criam-se motivações simplistas. Mas elas fazem sua parte na luta pela igualdade diante dos homens até na audácia da morte violenta. Não lhes falta a coragem.
Os jihads, homens e mulheres, são atores de uma das maiores tragédias de nossos dias. Da força negativa dos extremismos.
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