O divórcio para elas e para eles

Autora colheu depoimentos de homens e mulheres que passaram pela separação – e reuniu dicas para os dois

No começo tudo parece um conto de fadas, mas muitas histórias têm um final. Para ajudar homens e mulheres a sobreviverem a essa etapa desgastante (e comum), a editora Eliana Santoro colheu depoimentos de homens e mulheres que passaram pelo divórcio.

Ela é casada desde 1995, mas logo cedo teve que se deparar com as dificuldades que uma separação traz. Filha de pais divorciados, Eliana Santoro percebeu que o processo de divórcio pode ser dividido em três etapas: antes, durante e depois.

Para entender os dois lados da moeda (delas e deles), a escritora, junto com psicoterapeutas e advogados, olhou com atenção 31 depoimentos feitos por mulheres e homens. O resultado rendeu dois guias de sobrevivência da separação, para que as duas partes descubram como sair inteiras após o grande baque. Confira a entrevista que o iG fez com a autora de “Divórcio para elas” e “Divórcio para eles” (ambos da Ed. Tao).

Como surgiu a ideia de escrever o livro?
Fui convidada para desenvolver esse projeto. Logo me identifiquei com a abordagem proposta e comecei a montar a equipe, escolhendo duas jornalistas para a realização das entrevistas. Nas pesquisas iniciais, vimos que era fácil encontrar nas livrarias títulos sobre divórcio, mas, em geral, eles são escritos por psicólogos para psicólogos, com jargão técnico, abordagem teórica etc. Ou então, são livros sobre legislação, também técnicos, para o uso de advogados.

Faltava uma obra que abordasse o assunto para o público geral, que buscasse ajudar o leitor que está passando por essa fase e que, ao mesmo tempo, estivesse afinada com nossa realidade, que trouxesse elementos reais e sólidos de ajuda, com informações embasadas e experiências de vida. Em momento algum “enganamos” o leitor, dizendo que a separação pode ser fácil ou que é só pensar positivo, que tudo se resolve. Divórcio dói, e dói muito, para todos os envolvidos, mas, com a ajuda adequada, esse caminho pode se tornar mais suave – e a experiência de nossos entrevistados mostra que a superação é possível. A sensação que procuramos passar nos livros é de uma conversa informal, quase uma terapia de grupo, com a presença de amigos e especialistas.

Como foi a sua primeira experiência com o divórcio, durante o término do casamento dos seus pais? Após esse momento, você deparou com outras separações novamente?
Na época, eu tinha entre 12 e 13 anos. Meus pais, na verdade, nunca me pareceram se dar bem, as brigas eram constantes. Era claro para mim, mesmo naquela época, que meu pai não se separava por minha causa: sou filha única e ficar longe de mim realmente seria – como acabou sendo – um grande sofrimento para ele. A situação chegou a um ponto insustentável e veio a separação. Foi muito difícil. Não quis nem estar em casa quando meu pai saiu, levando as coisas dele, e por muito tempo o sofrimento foi enorme.

Mas o pior, mesmo, não foi a separação em si. Minha experiência comprova o que os especialistas dizem: é pior, para a criança, viver em um ambiente em desarmonia do que superar o trauma da separação dos pais, desde que esse rompimento se dê com alguma tranquilidade, com algum equilíbrio, e que a saúde emocional da criança seja respeitada.

Depois de um tempo, meu pai e eu nos reaproximamos e começou uma relação ainda melhor, com ele e com a nova família dele. Hoje ele é falecido, mas os laços que tenho com minha madrasta e a família dela são mais fortes que os que tenho com minha própria família “de sangue”. Enfim tudo passa, a gente se reinventa. Tenho amigas e parentes que se divorciaram; alguns desse casos acompanhei mais de perto e posso realmente dizer que o chão falta nessas horas, não importa a idade, a formação, a conta bancária. Todos os envolvidos sofrem, não tem jeito. Mas, com a ajuda dos amigos, da família, de profissionais de diversas áreas e, é claro, esforço pessoal, a superação vem. O que fizemos nos livros foi isso, trazer essa ajuda até o leitor.

Entre as principais causas de separação, quais são mais constantes entre as mulheres? E para os homens? Há grande diferença?

São muitos os motivos aparentemente “externos” que levam à separação – infidelidade de uma ou de ambas as partes, problemas financeiros, desemprego (sobretudo do homem), rotina, doença grave ou incapacitante de um dos cônjuges, incompatibilidades, até mesmo a perda de um filho pode jogar cada um para um lado... Tivemos um caso assim entrevistado no “Divórcio para eles”. Mas o que é possível perceber, salvo em situações muito extremas, é que, antes da infidelidade, das brigas por dificuldades financeiras, da rotina massacrante ou de qualquer outra coisa, algo já havia se “quebrado”, se “desfeito” na relação do casal. A grande sabedoria, nesses casos, é saber ou sentir se isso que se “quebrou” ou se “desfez” pode ser consertado, se vale a pena ser consertado, ou se o homem e a mulher terão realmente mais chances de serem felizes em caminhos diferentes.

Foto: Divulgação
Eliane Santoro, autora de 'Divórcio para eles'e 'Divórcio para elas': homens têm 6 vezes maischances de entrar em depressão quando sedivorciam do que quando casados
De que forma o divórcio costuma afetar a vida das mulheres? Quais as principais mudanças na vida delas?
Para a mulher, mesmo quando é dela a iniciativa pela separação, fica sempre a sensação de fracasso, de projeto de vida que não deu certo, a vergonha de ter de admitir isso para a família. Se a iniciativa parte do marido, o que pesa sobre a mulher é a dor do abandono. Quando há filhos dessa relação que acabou, é ainda mais difícil, pois a mulher tem de passar a cuidar deles sozinha, ser forte em dobro, por ela e pelas crianças. É um exercício imenso de equilíbrio. Nossas entrevistadas deixaram claro o caráter mais ritualístico da mulher que se separa – ela muda a decoração da casa, o cabelo, as roupas, faz aquela plástica que vinha adiando havia tempo... No “Divórcio para elas” há muitos relatos e dicas sobre isso.

Qual o momento crucial para tocar no assunto de divórcio?
Nos dois livros há dicas sobre COMO conversar – se é melhor em casa ou em um local público, a dois ou com a presença de outras pessoas, como evitar maiores atritos, preservar os filhos de certas “cenas” que podem acontecer. Dizer QUANDO é esse momento é algo bem complicado. Cada caso é um caso. Às vezes a constatação acontece abruptamente – com a descoberta de uma traição ou numa briga mais violenta. Ou essa mesma conclusão pode amadurecer aos poucos, dia após dia, a partir da percepção de que não existe mais amor, de que a desilusão e a rotina venceram. A perspectiva de continuar numa relação tão insatisfatória vai se tornando mais e mais insuportável até que o alarme dispara.

Quais as diferenças entre mulheres e homens na hora de lidar com a frustração dos sonhos cancelados?
Quem termina um casamento, a pessoa também está se divorciando de muitos sonhos – viver uma cumplicidade amorosa e feliz, gerar e criar filhos, dar a volta ao mundo com o parceiro/a parceira ou envelhecer com ele/ela, quem sabe numa casa de praia ou de campo, recebendo os netos nos finais de semana... Na hora da separação, a pessoa está mais ligada no passado do que no futuro e, ao desfazer os laços do casamento, ela também se despede desses sonhos.

É preciso viver esse “luto”, não tem jeito. As mulheres experimentam uma sensação de fracasso pessoal, vergonha, projeto de vida arruinado. Muitas, para tentar fugir desse sentimento, às vezes buscam substituir rapidamente o parceiro, entregam-se a comportamentos compulsivos – estouram o limite do cartão de crédito, exageram na bebida, comem demais ou fazem regimes malucos. Os homens, naturalmente mais fechados, têm 6 vezes mais chances de ter depressão quando se divorciam do que os casados! Eles ficam perdidos, sem chão, em geral procuram logo outras relações, têm mais resistência a fazer terapia, cuidam menos da saúde – os homens são minoria nos consultórios, só vão ao médico quando a coisa fica realmente feia e, em geral, “empurrados” pela esposa ou pela mãe.

Os filhos são um grande dilema na hora da separação. Eles são capazes de prolongar um casamento ou até de melhorar uma relação aparentemente falida?
Até certo ponto, sim, os filhos podem “segurar” o casamento ou fazer com que o casal tente com mais afinco salvar a relação. Minha própria história é um exemplo claro disso. Pelo que os homens entrevistados para o livro relataram, esse adiamento acaba sendo mais comum da parte do pai, pois, como em quase 90% dos casos os filhos ficam com as mães, é o pai que será privado do convívio diário com as crianças. Mas às vezes chega o momento em que não é mais possível a convivência, e a separação se torna a única solução. O que acho importante frisar – mais uma vez – é que os filhos sofrem muito mais com um lar desarmônico, em guerra, sem respeito mútuo entre o casal, do que com pais separados, equilibrados e felizes cada um a seu modo.

Como elas e eles agem na hora de “sacudir a poeira e dar a volta por cima”? Você notou semelhanças e diferenças?
Depois de um divórcio, homens e mulheres experimentam a solidão. As mulheres muitas vezes se fecham e algumas enfrentam longos períodos sem qualquer tipo de relacionamento mais íntimo – as entrevistadas para o livro relataram as dificuldades de “voltar ao mercado” de mulheres “namoráveis”. O homem maduro, quarentão e até cinquentão, pode, em contrapartida, ser visto como “charmoso”, “experiente”, “como um vinho melhorado”, mas eles passam um bom tempo perdidos e confusos, sem conseguir manter um vínculo verdadeiro com ninguém – sentem-se sozinhos, mesmo quando estão saindo com várias mulheres. Também é fato que eles voltam a se casar mais rapidamente. Mulheres são mais ritualísticas e dividem socialmente seus problemas – nas entrevistas, isso ficou claro. Há histórias bem interessantes nos livros.

E a questão financeira? Ela atinge o casamento de formas diferentes para os dois?
Claro que estamos pressupondo a situação mais típica, em que é o homem quem sai de casa e paga pensão para os filhos, que ficam com a mulher. Ou ele paga pensão para a ex, no caso dela não ter como se manter sozinha, mesmo que não haja filhos. As decisões judiciais costumam se basear em dois princípios: a possibilidade de quem paga e a necessidade de quem recebe.

Nesse cenário mais comum, basta pensar o seguinte: o homem continua ganhando o mesmo salário, mas agora tem de alugar ou comprar um novo imóvel para morar, com todos os custos imediatos e permanentes que isso implica, e continuar a contribuir para o sustento dos filhos e/ou da ex-esposa. Claro que a rotina financeira da mulher também é abalada, mas a incidência de casos de homens separados que voltam a morar com os pais ou são obrigados a improvisar um cantinho na casa de amigos ou de outros familiares nos leva a pensar que, no bolso, é ele quem sofre mais. Mais uma vez, o diálogo entre as partes e o equilíbrio fazem toda a diferença. No final de cada um dos livros há uma seção específica falando dessas questões, direcionada, conforme o caso, para a realidade do homem ou da mulher.

E na hora de preencher o coração novamente? É realmente mais difícil para as mulheres?
Sim. Elas se tornam mais exigentes na busca de um novo parceiro, se fecham por mais tempo, passam por um período de “auto-reinvenção”. Além disso, se há filhos da relação anterior, ficam mais temerosas de “colocar um outro homem dentro de casa” ou se dedicam mais às crianças no dia a dia como forma de compensação à falta do pai.

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