Médicos explicam como o transtorno afeta meninos e meninas menores de 15 anos
Os 25 quilos de um menino de 12 anos da Inglaterra – e a insistência do garoto em recusar qualquer alimento por medo de engordar- trouxeram à tona que a anorexia nervosa não é problema só do mundo da moda e das passarelas. O transtorno chegou às crianças, inclusive, aos meninos.
A imprensa britânica noticiou a batalha do menino Taylor Kerkham em conseguir encarar a comida não mais como algo negativo, prejudicial e tóxico e, sim, uma aliada do desenvolvimento. Para isso, foram necessários quatro meses de internação hospitalar e psicoterapia (ainda em curso). A mesma missão de recuperar a desnutrição grave dos pacientes infantis, impulsionada pela vontade das crianças de emagrecer a todo custo, é vivenciada por profissionais brasileiros.
À BBC de Londres, os familiares de Taylor Kerkham disseram que o transtorno da recusa de comida começou quando os colegas de escola “brincavam” e chamavam o garoto de “gordinho” por causa do seus 50 quilos da época (um pouco acima do indicado para a sua idade). Foi o suficiente para despertar uma doente insatisfação com a forma física.
No Brasil, pesquisa do IBGE, divulgada no fim do ano passado, mostrou que as estudantes brasileiras também correm perigo para tentar “ficar” feliz com o espelho. Em uma amostra de 61 mil estudantes, foi identificado que 4.270 delas forçavam o vômito ou tomavam remédios para emagrecer (principal sintoma da bulimia). Todas tinham menos de 17 anos.
Pesquisadores de Minas Gerais e de Florianópolis, em estudos publicados no Caderno de Saúde Pública, identificaram que os sintomas de anorexia em meninos e meninas em idade escolar (13 a 15 anos) atingia a marca de 15,8% entre as quase 3 mil pesquisadas.
Influência dos pais
Ao mesmo tempo em que o motivo para buscar a diminuição do peso pode ser o bullying e a pressão dos colegas de classe, conforme mostrou levantamento publicado na revista Pediatrics , Elaine Rocha de Pádua, nutricionista da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) - especializada em transtornos alimentares infantil - diz que as respostas para origem do problema com a comida pode estar na educação recebida pelos pais.
“Existe uma série de fatores que pode estar por trás da anorexia nervosa em meninos e meninas e um deles é a amamentação”, explica Elaine. “Se a mãe toda a vez que o filho chora dá o peito para ele, a criança cresce convicta de que só encontra conforto na comida. Isso pode torná-la, no futuro, uma comedora compulsiva e aproximar a bulimia ou a obesidade”, diz. “Da mesma forma, um período natural do desenvolvimento infantil é a chamada fobia alimentar. A criança (até os seis anos) tem medo de comer o que não conhece e forçá-la de forma abrupta a ingerir o alimento nessa fase pode resultar em transtorno alimentar futuro.”
Uma pesquisa da Universidade de São Paulo, recém divulgada, sugeriu mesmo que a anorexia pode ser hereditária . Para sustentar isso, o estudo mostrou que as mães de meninas anoréxicas, em geral, ou falavam muito de forma física ou obrigavam as meninas quando a crianças “a rasparem o prato” ou só brincarem depois de “comer tudo” ou ainda sofreram do transtorno quando mais jovens.
Elaine, da Unifesp, e Raphael Cangelli Filho, do Hospital das Clínicas, ressaltam que todas essas características fazem com que a cura para os transtornos alimentares na infância exija, necessariamente, a participação ativa dos pais no tratamento. Existem casos que a anorexia pode indicar mais do que uma insatisfação com o corpo, mas algum problema sério como violência física, sexual ou psicológica.
Prestar atenção como o seu filho se relaciona como a comida, afirmam os especialistas, é a maneira mais fácil de reconhecer problemas e fazer intervenções rápidas. Depois de instalada, a anorexia tem de ser acompanhada pelos médicos para o resto da vida.