Especialista explica como tornar o retorno à escola um processo tranquilo
Com o início do segundo semestre e o avanço da vacinação, estados e municípios brasileiros planejam a volta às aulas em massa e uma readaptação às aulas presenciais é importante para as crianças
Muitas crianças e adolescentes retornam às aulas presenciais nesta segunda-feira (2). Isoladas em casa e com o ensino remoto desde março de 2020 , devido à pandemia pela Covid-19, voltar ao convívio social não é como voltar de férias nem mesmo como a primeira ida à escola. Além das máscaras e protocolos de higiene, neste período muitas crianças foram educadas sobre o distanciamento social e os riscos de proximidade - que fazem parte do protocolo para volta às aulas .
Muitas crianças e adolescente perderam pessoas em sua vida - o Brasil soma, pelo menos, 45 mil órfãos pelo coronavírus - e este fator também deve ser levado em consideração quando se fala do retorno às aulas . Para entender mais sobre quais comportamentos devem servir de alerta aos pais e educadores, bem como medidas que podem ser tomadas, o iG Delas conversou com a psicóloga Nanda Perim.
A escola é uma piscina
"A grande diferença da adaptação escolar antes e agora são duas. Primeiro que as crianças estão há muito tempo dentro de casa, sem conviver com outras crianças. Com um convívio mais intenso com os pais - e isso faz uma diferença grande. Então é uma adaptação mais intensa. A segunda grande diferença é que os pais provavelmente não podem entrar na escola."
A especialista fala que a escola é uma piscina com água gelada que a criança precisa se acostumar e traz o questionamento sobre jogar a pessoa de uma vez ou respeitar o ritmo dela. "Você jogar essa criança em uma piscina de água gelada e ir embora, essa criança vai sofrer e criar uma uma sensação de insegurança naquele ambiente. Não vai querer ir, alguns dias depois não vai querer nem entrar, nem colocar uniforme ou chegar perto da escola."
Apesar da cultura que normaliza o choro das crianças, independente do tempo e do que ele possa ocasionar (como vômito), a especialista diz que ele é um sinal de alerta, se não o primeiro, de que a adaptação não está fluindo. Além disso, a apatia merece uma atenção especial e não deve ser confundida com bom comportamento.
De acordo com Nanda, provavelmente a criança está anestesiada porque o cérebro dela ficou com tanto medo e ela não soube lidar, que desligou. Por fim, a agitação também é um ponto de alerta sobre não conseguir enfrentar a situação.
Crianças enlutadas
Com mais de 500 mil mortos pela Covid-19 no Brasil, muitas crianças e adolescentes que vão retornar para as escolas estão vivendo um luto. Assim, apesar do clima de comemoração pela volta às aulas, é importante lembrar este contexto não só na recepção, mas nos dias letivos que seguem. A especialista ressalta a importância da instituição docente conhecer a realidade e o que aconteceu com o aluno neste período em que as aulas foram remotas.
"Eu recebi a mensagem de uma mãe de gêmeos que tinha acabado de perder o marido e, na adaptação, ficou o primeiro dia de aula e não perguntaram nada. Os meninos ficaram chorando o dia inteiro e, quando a mãe foi buscar na escola, a professora falou que um deles devia ser autista porque ele é muito esquisito. Então, olha essa recepção, a mãe e as crianças enlutadas. O que elas recebem: um rótulo. Um diagnóstico totalmente antiético, anti-profissional. Assim, a maior preocupação tem que ser em contextualizar a realidade dessas crianças para adaptar."
A especialista destaca que cada criança tem seu tempo, mas que, dentro dessas condições, provavelmente o período de adaptação dure cerca de dois ou três meses. Neste tempo, o esperado é que elas não queiram ir alguns dias, ou ficar um período menor do que o programado, tenham dificuldade em dividir os brinquedos e outras interações sociais. Nanda aponta que é preciso paciência e acolhimento neste processo.
"Eu sugiro que as escolas façam vídeos apresentando os professores, a sala de aula, aquela escola, para a criança chegar na escola já ambientalizada. São vários detalhes que podem fazer toda a diferença. Uma coisa que os pais podem fazer é ter uma rotina na parte da manhã, um ritual de ir pra escola. Então a criança vai começar a se acostumar com a temperatura da água antes de sair de casa. Você vai dar vários avisos, vai botar o uniforme na frente da criança porque vai começar a conversar sobre como a escola é legal, por que é legal, o que tem de legal lá. O vídeo ajuda nisso: 'Lembra da professora? Você vai encontrar ela lá. Lembra daqueles brinquedos? Você vai encontrar eles lá.' Então, todo um ritualzinho antes de sair de casa para essa criança não chegar tão crua na porta da escola", conclui.