A primeira conversa com o filho autista

Odara Gallo é mãe de Franco, de 3 anos, diagnosticado com autismo, e escreve sobre a experiência às sextas no Delas

Aos dois anos Franco mal falava. Imitava alguns sons, mas nada que chegasse perto de uma comunicação de verdade. Foi aí que marcamos a fonoaudióloga e o diagnóstico começou a virar uma realidade.

Foto: Arquivo pessoal
Franco tem autismo e, aos dois anos, ainda não conversava

Ele melhorou bastante em alguns meses. A música ajudou. Começou a cantar músicas inteiras direitinho, a coisa mais bonitinha! Vídeos e mais vídeos que ultrapassavam os limites da fofura foram feitos, compartilhados. Família se derretia.

Mas não, aquilo ainda não era se comunicar. Conversar.

A alegria de ver a evolução do Franco, algumas vezes, se desmanchava quando eu me pegava pensando: "Ele só está repetindo. Repete que é uma beleza, pronúncia perfeita. Mas, ainda assim, é só uma repetição".

- Quer comer?

- Sim!

- Quer água?

- Sim!

Começou a responder! Estamos nos comunicando de fato!!!

- Você prefere danone ou banana, Franco?

- Sim!

É... Ainda precisamos treinar mais.

O desânimo não toma conta a maior parte do tempo. Simplesmente porque não há tempo pra isso. Cada momento pode ser uma oportunidade para uma nova descoberta, afinal. Por isso, todas as vezes que buscava Franco na escola procurava repetir a mesma rotina de tentar estabelecer algum diálogo.

- E aí, filho? Como foi na escola?

- ... (Silêncio)

- Você brincou do que?

- ... (Silêncio)

- Quem estava lá? O Lucca? O Enzo? A Tia Fernanda?

- ... (Silêncio)

Franco fez três anos e as respostas ainda se limitavam a confirmar algo que ele queria. Não mais que isso. Meses e meses se passaram sem resposta. Um dia, no meio do jantar...

- Foi a icolinha...

- Quê, filho?

- Foi a ICOLINHA!

- Na escolinha?

- Bincou massinha.

- É? E o que mais?

- O [L]ucca, o Enzo...

- ... (Silêncio)

Foi a minha vez de ficar sem palavras.

_______________________________________________________________________

Foto: Arquivo pessoal
Odara e o filho, Franco

*Odara Gallo é formada em Jornalismo desde 2006, mas só criou coragem para ter um blog dez anos depois, quando descobriu que seu filho, Franco, tinha Transtorno no Espectro Autista. Às sextas, escreve sobre sua experiência no Delas. "Num dia Franco era uma criança diferente. No seguinte, eu era mãe de uma criança autista. Um pouco do que aconteceu dentro de mim com essa mudança quis sair e se desenhar em palavas. Nasceu esse blog. Quê Cê Qué? "