"Tarsila do Amaral queria ser a pintora do Brasil”, diz sobrinha da artista

A pintora, um dos expoentes do Modernismo Brasileiro, nasceu há 135 anos

Foto: Acervo/Tarsila do Amaral
Tarsila do Amaral: “Ela queria ser a pintora do Brasil”, diz sobrinha da artista

No dia 1º de novembro de 1886, em Capivari, interior de São Paulo, nasceu a mulher que viria a se tornar um dos maiores símbolos da arte brasileira. Tarsila do Amaral, filha de José Estanislau do Amaral e Lydia Dias de Aguiar do Amaral, trouxe nas telas cores fortes, vivas, além de retratar a realidade do Brasil. Tarsilinha do Amaral, sobrinha-neta da artista, descreve ao iG Delas a importância da tia e do legado dela no mundo artístico. “Ela dizia que queria ser a pintora do Brasil, queria representar o Brasil na arte dela”, comenta Tarsilinha. 

Após estudar alguns anos na Europa, Tarsila voltou ao Brasil disposta a romper com os antigos padrões de pintura. Desse modo, inspirada pela Semana de Arte Moderna de 1922 e ao lado dos artistas Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Anita Malfatti e Menotti Del Picchia realizou reuniões, festas e conferências para mudar o cenário cultural do país. 

“Ela foi um dos ícones, um dos pilares do Movimento Modernista. Um movimento que mudou a arte brasileira. Antes, a arte era muito acadêmica, a música era clássica, a poesia era parnasiana. E esses artistas queriam mudar essa arte tão tradicional. Então trouxeram, principalmente de Paris, que era o grande centro cultural da época, várias técnicas novas”, explica Tarsilinha.

“No caso da minha tia, ela teve o contato com o Cubismo, que é a técnica que ela mais entende, que tem mais a ver com o que ela queria representar. Ela traz essa técnica para o Brasil”, conta. Em 1923, Tarsila volta para Paris e tem aulas com o mestre cubista Fernand Léger. No mesmo ano pintou “A Negra”, quadro que representa as filhas dos escravos que viviam na fazenda de seu pai. 

Além de representar o cenário rural e urbano do Brasil, Tarsila também chamou a atenção por conta das cores que escolheu para pintar seus quadros. Consideradas feias e caipiras na época, os próprios professores diziam que a artista não deveria utilizá-las em conjunto. 

“Eram as cores da infância dela, que ela gostava quando era criança. Era isso que ela queria passar nas obras dela. Ela tinha todo esse olhar para o povo brasileiro, para fauna, flora. Ela queria mostrar o Brasil com essas cores, tipicamente brasileiras, cores fortes”, pontua Tarsilinha.


Em 1928, Tarsila do Amaral pintou “Abaporu”, a obra de arte brasileira mais valiosa do mundo. A tela foi feita como presente para o marido, Oswald de Andrade. Foi ele quem sugeriu que a figura no quadro seria um homem antropofágico. Ao pesquisar a palavra em um dicionário tupi-guarani, Tarsila reuniu as palavras “aba” (homem), “pora” (gente) e “ú” (come). Ou seja, o “homem que come gente” ou “homem antropófago”. Na concepção dos modernistas, era necessário deglutir e retirar o melhor da arte produzida na Europa e realizar obras genuinamente brasileiras. 

Foto: Acervo/Tarsila do Amaral
Tarsila do Amaral: “Ela queria ser a pintora do Brasil”, diz sobrinha-neta da artista


Tarsilinha do Amaral é neta de um dos irmãos de Tarsila. Atualmente, é ela quem cuida da divulgação do legado da artista. “A gente sempre teve uma proximidade muito grande. Meu pai era o advogado dela, minha avó, casada com meu avô, era a melhor amiga dela. Meu pai e minha mãe adoravam a tia Tarsila e eu também. Então, meu desejo de cuidar da memória dela começa muito com essa relação muito forte da minha família”, explica. 

Hoje, a imagem da Tarsila, bem como a das pinturas dela, são extremamente populares no Brasil. Segundo a sobrinha-neta da artista, isso se deve muito ao trabalho que ela efetua, há mais de 20 anos, para divulgar o trabalho da tia.

“Eu tenho um orgulho enorme de carregar um nome tão importante. E ainda por ser uma pessoa tão querida por mim, pelo meu pai, pela minha mãe, pela minha família. Eu acho que quanto mais ela alto ela chega, tanto na arte nacional como internacional, maior é a responsabilidade em cuidar deste trabalho”, diz. 

Tarsilinha também se prepara para o lançamento de "Tarsilinha", animação sobre a obra de Tarsila do Amaral que deve estrear em 2022. “Estamos trabalhando na animação há 12 anos. Eu tive a ideia de fazer um desenho mostrando um pouco do lado dela da infância, que ela passou na fazenda dos pais e que depois vai ser tão importante nas obras dela. As crianças gostam muito das obras dela e agora cada vez mais as crianças estudam a Tarsila nas escolas. Por isso, achei necessário contar a vida dela sob essa ótica infantil”, conta. A animação é uma produção da TV Pinguim e em 2021 ganhou o Festival Chilemonos, no Chile, o maior festival de animação da América Latina. 

Tarsila foi uma mulher a frente de seu tempo. No primeiro casamento, decidiu romper a relação quando o marido tentou proibi-la de seguir na carreira artística. Ela viria a se casar novamente por outras duas vezes. Para Tarsilinha, a vida e a obra da artista caminham juntas. “Toda essa vanguarda que vemos na obra dela, ela teve também na vida pessoal. Ela levou uma vida que foi considerada a frente do seu tempo e a sua obra também acompanhou essa vanguarda”, encerra Tarsilinha.

** Beatriz Neves é estudante de jornalismo. É estagiária de Soft News do iG desde março de 2021 e já escreveu para as editorias Delas, Receitas, Turismo, Gente, Canal do Pet e Queer. É apaixonada por tudo o que envolve livros, cinema e música, principalmente os clássicos.