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Empresária que vendia água na porta da faculdade construiu império com 160 clínicas odontológicas espalhadas pelo Brasil

Carla Sarni, dona da rede odontológicas Sorridents
Eduardo César/Fotoarena
Carla Sarni, dona da rede odontológicas Sorridents
Você já ouviu falar em Carla Sarni? Talvez não, mas as chances de conhecer a rede de clínicas odontológicas que ela fundou são maiores. A Sorridents, maior rede da América Latina, está presente em mais de 125 localidades do país. Em breve, este número aumentará para 160, já que muitas franquias vendidas estão em fase de implantação. Mas aos 37 anos ela quer mais. Está de olho no mercado de Portugal e Angola. O objetivo é um só: ser a maior do mundo no ramo.

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“Sempre tive o dom para os negócios. Quando eu tinha uns 12 anos ganhei da minha mãe alguns carretéis com linha. Coloquei dentro de uma bacia e fui para a frente do mercado central da minha cidade. Levei duas cadeiras e ficava chamando as pessoas com a frase ‘entra, entra freguesia, chucha dinheiro na bacia’. Vendi tudo e comprei uma bicicleta cor de rosa”, conta a empresária com um bom-humor muito característico.

Roupas, bombons e garrafas de água
Ela vem de uma cidade pequena do interior de São Paulo, Pitangueiras. O pai era motorista de ônibus circular e a mãe vendia queijos e requeijão e, quando conseguiu juntar um dinheiro, comprou uma pequena loja onde começou a vender roupas. Carla cursava magistério pela manhã. Ela frisa que a única razão para estudar para ser professora era porque o curso era gratuito. Durante a tarde ajudava a mãe e no período noturno freqüentava as aulas do ensino médio, antigo colegial. Quando seu primo perguntou se ela não queria ir com ele para Minas Gerais prestar vestibular de odontologia, a vida da empresária tomou um novo rumo.

“Eu fui porque a inscrição não era cara e porque ele disse que ia ter muitas festas. Não achei que poderia ser aprovada”, confessa. Depois da boa notícia, veio o balde de água fria. A mãe, comerciante que contava o dinheiro no fim do mês e lutava para pagar as contas com o lucro da loja e o salário do marido, disse que não tinha condições de sustentá-la em outra cidade e ainda mais comprar os materiais didáticos tão caros que o curso exigia. Ela não desistiu e pediu permissão para tentar se manter sozinha. A experiência seria de apenas seis meses. Se não desse certo, Carla voltaria para sua cidade para terminar o magistério.

Foi então que ela começou a retirar roupas da loja da mãe e vender nas repúblicas de Alfenas, cidade mineira onde cursou faculdade. O período integral de estudos não desanimava a aluna. Depois das aulas ela visitava as casas de estudantes e vendia seus produtos. Quando as roupas acabavam, ela fazia bombons. Na época de vestibular, ia para a porta da faculdade vender garrafas de água. E desta forma ela se manteve no curso e ainda mandava o dinheiro que sobrava para ajudar os pais. “Fui apelidada de sacoleira, mas foi assim que eu me formei”, lembra.

Consultório em cima da padaria
Depois de se formar, Carla resolveu vir para São Paulo. Morava de favor na casa de um tio e começou a procurar emprego. Não foi aprovada num processo seletivo de um consultório que ficava em cima de uma padaria, na Vila Císper, zona leste da capital. Mesmo com a negativa, a empresária esperou todos os candidatos irem embora e reforçou ao dentista que, caso o profissional escolhido desistisse da vaga, ela precisava muito daquele emprego. Dias depois, ele a contratou.

“Depois de três meses, formava fila na porta por pessoas que queriam ser atendidas por mim”, afirma. Ainda na época que estava na faculdade sua avó e uma tia começaram a pagar um carnê de prestações para uma cadeira de dentista para Carla. Quando a cadeira saiu, ela informou o dono da clínica que iria embora. Foi quando ele lhe que ela comprasse o consultório. Ela pagou 12 mil reais em 10 parcelas. E começou a expandir alugando as salas ao lado.

Enquanto trabalhava, pagava um consórcio de um automóvel. “Quando meu carro saiu, eu pensei: ‘vou deixar de ser pobre’. Mas, justamente nesta época, um imóvel perto do meu consultório foi colocado à venda. Eu dei meu carro como entrada e financiei o resto em 15 anos. Depois daí, tudo começou a mudar.

Faturamento de 104 milhões de reais
Em menos de 10 anos, Carla e alguns dentistas parceiros já possuíam 23 unidades da Sorridents. Em 2004, ela e o marido formataram o sistema de franquia e hoje a empresa é a maior do ramo, na América Latina, com 160 clínicas odontológicas. O faturamento do ano passado foi de 104 milhões de reais e o esperado para este ano é a quantia de 120 milhões.

Com o dinheiro vieram pesadas 16 horas de trabalho por dia, falta de tempo para atividades cotidianas, como ir ao mercado, e também para a família. Mãe de dois filhos, um de oito e outro de sete anos, Carla não participava mais da rotina das crianças. Há quatro anos, seu filho mais velho ficou dias internado numa UTI (unidade de terapia intensiva). Foi quando ela decidiu rever suas prioridades.

“Hoje a minha agenda depende dos meus filhos. Almoço em casa de duas a três vezes por semana e, durante o período de prova dos meninos, eu chego em casa às sete da noite e tomo a matéria até às nove. Depois volto a trabalhar lá mesmo. O fim de semana também é da minha família. A gente adora sair para comer fora, ir ao teatro e ao cinema”.

Tirando os filhos, o restante do tempo é dedicado integralmente aos negócios. A manicure e o cabeleireiro vão na sua casa e shopping nem pensar! “Só compro roupa ou sapatos quando realmente preciso. Não tenho tempo de ficar zanzando nas lojas. Também só pago o que considero justo. Não vou gastar cinco mil reais com uma bolsa aqui no Brasil, se posso comprá-la por menos da metade nos Estados Unidos ou na Europa”.

“Sou extremamente econômica”
O que mudou com dinheiro e sucesso? “Basicamente temos muito mais conforto. Além disso, posso viajar para todos os lugares que sempre quis conhecer. Não dá para tirar períodos longos de férias, mas quando podemos, eu e meu marido, pegamos as crianças e vamos passear. Hoje em dia eu até desligo o celular”, conta Carla.

A família também possui um “refúgio” para os fins de semana: uma casa dentro de um condomínio fechado no Guarujá, litoral de São Paulo. “Na praia a gente sai para andar de bicicleta com as crianças e curtimos muito este momento com a família”.

A empresária conta que é econômica por natureza. “Não consigo sair gastando dinheiro sem pensar. Sei que tive que renunciar a muitas coisas na minha vida pessoal, por isso dou muito valor a tudo que conquisto. Na minha casa, por exemplo, fazemos mercado às quartas-feiras, dia em que legumes e frutas estão em promoção. Meus filhos só ganham presentes em datas comemorativas e se eles quebram algum brinquedo, precisam juntar o dinheiro de suas mesadas para comprar outro. Eu sempre falo que não vou repor algo que eles não cuidaram. Acredito que eles dão muito valor ao que têm e que já entendem que é preciso trabalhar muito para ter sucesso e uma vida confortável”, completa Carla.