Entre as minhas inúmeras idas a médicos de diferentes especialidades sempre saio com a orientação de dedicar minutos do meu dia à prática de alguma atividade física. Não precisaria nada especial nem custoso. Bastaria, por exemplo, subir alguns andares de escada, caminhar dentro de casa ou na rua do bairro onde moro. Nunca levei nenhum desses conselhos ou advertências realmente a sério. Nunca fiz nada de forma regular – três ou quatro vezes por semana, durante 20 ou 30 minutos.
Sou assumidamente uma pessoa sedentária e até bem pouco tempo via o meu sedentarismo com um certo grau de humor. Uma marca pessoal. Porém, dois episódios recentes abalaram a minha convicção de sedentária praticante.
Há pouco mais de um mês, na festa junina da escola da minha filha, caminhei até a arquibancada para assistir lá de cima a quadrilha dos alunos. Ao tentar subir os degraus altos faltou força nas pernas. Tive que mobilizar as pessoas que estavam ao meu redor, a maioria desconhecida, para conseguir subir até onde pretendia. Senti vergonha.
O segundo episódio, porém, foi ainda mais impactante. Em consulta com um cardiologista para rever o remédio que vinha usando para controle da pressão arterial, o médico me deu um ultimato: "se continuar assim, sem fazer regularmente uma atividade física, daqui a dez anos você vai estar usando uma bengala para se equilibrar melhor". Isso mesmo que você leu: uma bengala.
A causa da sentença do cardiologista estava descrita no resultado de um exame chamado densitometria corporal que fiz dias antes a pedido da minha geriatra: massa magra (incluindo os órgãos internos, líquidos, pele e músculos) diminuída em relação ao ideal e gordura elevada. É normal mulheres perderem massa muscular a partir da menopausa por causa da queda na produção de hormônios. No meu caso, essa perda está acima do detectado para mulheres na minha idade, 57 anos.
A receita, a partir de agora, é fazer musculação e ter uma alimentação rica em proteínas, cálcio, vitamina D e, ao mesmo tempo, pobre em gorduras. É isso ou posso estar usando uma bengala a partir dos meus 67 anos, já que com pouca massa muscular, com articulações enferrujadas e ossos mais frágeis desprotegidos, qualquer movimento pode provocar uma queda - algo esperado bem mais à frente, por volta dos 75, 80 anos.
O QUE É SER SEDENTÁRIO?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) classifica o sedentarismo como uma doença e daquelas que matam. Estatísticas da instituição mostram que no mundo um em cada quatro adultos não pratica atividade física suficiente. No Brasil, de acordo com números de 2019 aferidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), os dados são alarmantes: 40,3% dos adultos a partir dos 18 anos foram classificados como insuficientemente ativos. Entre as brasileiras, o percentual era de 47,5% . Ou seja, como eu, muitas de vocês estão nas estatísticas e devem procurar fazer algo para garantir uma velhice com saúde.
A OMS defende que a atividade física regular é fundamental para prevenir e controlar doenças cardíacas, diabetes tipo 2, câncer, bem como para reduzir os sintomas de depressão e ansiedade, reduzir o declínio cognitivo, melhorar a memória e exercitar a saúde do cérebro.
E o que é ser uma pessoa sedentária? "É aquela pessoa que passa a maior parte do tempo acordada (em vigília) deitada ou reclinada gastando menos de 1,5 MET de caloria por minuto", informa a reumatologista Fernanda Rodrigues Lima, médica assistente e integrante do Núcleo de Coordenação das Residências Médicas em Reumatologia e Medicina do Esporte no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).
A reumatologista explica melhor a definição médica: "O MET é uma unidade de gasto energético. Para se ter uma ideia, quando a gente está dormindo, gastamos 1 MET por minuto. Quando estamos acordados sedentários, gastamos 1,5 MET. Quando estamos andando, o gasto é de 4 a 5 METs. Então o indivíduo sedentário não está gastando praticamente nada de energia. Ele está só acumulando gordura, acumulando placa de colesterol nas artérias".
As palavras da médica Fernanda Lima me dão um pouco de esperança numa boa velhice.
"Mesmo um indivíduo sedentário com mais de 50 anos pode se condicionar". Como, doutora? "Trabalhando massa muscular com musculação, com pilates, com elásticos, com o peso do próprio corpo. Trabalhando a flexibilidade, o alongamento, para ganhar altura e com isso retardar a perda de agilidade, essa sensação de rigidez que a pessoa mais velha vai ficando. E o mais bacana é que se você mantém o seu condicionamento aeróbico fazendo exercícios contínuos com os braços e com as pernas - dançar, andar, andar de bicicleta, nadar -, você melhora a sua capacidade de interação com o mundo e sua independência em relação às outras pessoas", afirma a médica (Veja a entrevista abaixo).
A conversa com ela foi gravada em 2017, quando eu não tinha a dimensão do quanto uma vida sedentária poderia contribuir para uma velhice ruim. Tudo que eu não quero. Veremos se com a vergonha que passei na escola da minha filha, o ultimato do cardiologista, a perspectiva de usar uma bengala antes mesmo de completar 70 anos eu consiga furar o bloqueio pessoal que tenho contra atividade física e passe a levar a sério os conselhos que recebi durante anos e mais anos de tantos médicos.