'Brazilian butt lift': médicos brasileiros defendem cirurgia de bumbum

Um em cada três mil procedimentos de lifting de glúteos acaba em morte; saiba os motivos e como evitá-los

Foto: Reprodução/ Arquivo pessoal
O dermatologista Ivan Rollemberg usa técnica segura e eficiente com três fases de injetáveis

Membros de diferentes conselhos médicos estaduais americanos se reuniram essa semana em Miami para discutir uma série de restrições em torno do procedimento estético que virou um dos queridinhos das americanas: “brazilian butt lift”, ou o levantamento do bumbum à brasileira, em tradução livre.

Aqui no Brasil ele é conhecido como lipoescultura ou lipoenxertia, que consiste em retirar gordura de uma região do corpo e introduzir nos glúteos. O problema é que o procedimento, apesar da classe médica o classificar como um dos mais seguros e eficazes na redefinição e no desenho da área, está sendo realizado de forma descontrolada, por médicos sem especialização na cirurgia e com volumes de gordura acima do indicado, resultando no aumento de desdobramentos fatais no país.

Desde 2015, por exemplo, foram contabilizadas 21 mortes. Dez só nos últimos três anos. No último dia 29, o cirurgião Oliver Pope Simmons chegou a ser proibido de realizar a operação após a morte, em abril, de uma de suas pacientes. Uma mulher de Indiana que tinha 47 anos.

Ela teve uma embolia gordurosa, quando partes da gordura entram em vasos sanguíneos e se alojam no pulmão e no coração, causando morte súbita. Esta é a principal causa de morte relacionada ao procedimento. Nos Estados Unidos, a cada três mil cirurgias feitas de enxerto no glúteo resultam em ao menos uma morte. Essa taxa de letalidade é a mais alta para qualquer procedimento estético.

Não é de hoje que a classe médica está preocupada com os números alarmantes de mortes causadas pelas cirurgias. Em 2017 foi criada uma força tarefa de cirurgiões e especialistas no mundo inteiro depois que o procedimento acarretou na morte de três pessoas apenas no estado da Flórida.

Na autópsia de todos os pacientes foi constatado a presença de gordura nos músculos glúteos, danos nas veias superiores e inferiores das nádegas e êmbolos gordurosos maciços no coração e no pulmão. O que significa que os cirurgiões injetaram o tecido mais profundamente do que pretendiam e com pressão acima do necessário.

O cirurgião plástico Raul Gonzalez, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica e criador da cirurgia por enxerto de gordura dos glúteos, participou da força tarefa de 2017 e ajudou a fomentar as resoluções apresentadas.

— As aplicações precisavam ser feitas na região subcutânea, ou seja, na parte mais superficial da pele para não pegar nos músculos, tínhamos que evitar usar cânulas dobráveis e móveis. Deveríamos prestar muita atenção na ponta do instrumento para ele não ir mais profundamente do que o necessário, e a injeção precisava ser feita com a cânula em movimento para evitar a alta pressão. Foi também solicitado que não extrapolasse no volume de gordura. Por exemplo, no Brasil dificilmente um cirurgião coloca mais do que 400 milímetros, enquanto nos Estados Unidos a média é de um litro em cada nádega — explica Gonzalez.

O médico, entretanto, defende que o crescimento no número de mortes está relacionado ao aumento de médicos não especializados no procedimento que o realizam sem os instrumentos certos e sem o ambiente clínico necessário.

Nas reuniões recentes em Miami, o conselho médico aprovou novas restrições aos cirurgiões que realizam esse tipo de procedimento. Além de precisarem usar um ultrassom no momento das cirurgias, no intuito de não enxertar gordura nas regiões mais internas do glúteo, os médicos precisarão realizar somente três operações no glúteo por dia para evitar fadiga e erros de distração.

A decisão tem gerado revolta por parte dos médicos que chamam a decisão de “arbitrária” e “insegura”, visto que uma grande parte dos profissionais não foi treinada para usar o ultrassom durante o procedimento. Eles pedem que os membros do conselho descartem a imposição e procurem outras maneiras de regular os procedimentos. A defesa parte, principalmente, de médicos que realizam apenas esse tipo de cirurgia e garantem que podem fazer mais procedimentos do que o limite diário.

Como a cirurgia é realizada


Apesar do nome, “brazilian butt lift”, remeter ao Brasil, os especialistas em cirurgias plásticas afirmam que as semelhanças entre o procedimento realizado nos Estados Unidos e no Brasil param na nomenclatura. O que explicaria a segurança da operação no país e a taxa mínima de letalidade. 

No Brasil, a cirurgia consiste em retirar, por meio de uma lipoaspiração, gorduras da região dos braços, flancos, ancas, cintura, abdômen, parte interna das coxas e culote, para enxertar nos glúteos em regiões selecionadas. Normalmente são colocadas nas áreas superiores, laterais e no sulco interglúteo (entre as duas nádegas), regiões que não possui muitos vasos sanguíneos, o que diminui o risco de ter uma embolia gordurosa. O tecido é injetado no subcutâneo e, em poucos casos, com pequenas quantidades, dentro do músculo. Também há um limite para o volume da gordura — no máximo 400 milímetros em cada nádega — e o enxerto é realizado por cânulas finas que medem de 10 a 50 centímetros.

— Nos Estados Unidos o procedimento funciona com diferenças essenciais na forma e no volume. Primeiro que a gordura é decantada, ou seja, mais fluída, e, portanto, propensa a escapar por dentro dos vasos sanguíneos, levando a uma embolia. O segundo é que o enxerto é feito na região sulco inferior, próximo a vasos sanguíneos calibrosos. A gordura é injetada por uma bomba que empurra o tecido para dentro da nádega ocupando regiões mais internas, incluindo o músculo do glúteo. Além disso, o procedimento visa um aumento da nádega por inteiro com aplicações de em média um litro em cada glúteo — diz Gonzalez.

Um fator estético que também diferencia as cirurgias brasileiras das americanas são as modelos de referência. A influenciadora Kim Kardashian, por exemplo, é uma das principais referências de mulheres americanas quando vão buscar fazer o procedimento estético. A cintura fina contrasta com o tamanho desproporcional dos glúteos, entretanto, o “padrão de beleza” é copiado por milhares de mulheres que procuram cirurgiões para aumentar suas nádegas.

— O que é feito e o jeito que é feito nos Estados Unidos não é repetido aqui. As americanas gostam do bumbum estilo Kardashian, ela foi, e ainda é, uma das maiores incentivadoras do procedimento. Se transformou em um símbolo disso. Mas no Brasil nós temos referências da garota de Ipanema, por exemplo. É uma bunda redonda, mais desenhada. Nós focamos na remodelagem e no desenho, não no tamanho — afirma o cirurgião plástico Leandro Faustino.

Segundo dados da Sociedade Brasileira de Cirurgias Plásticas, são realizadas cerca de 1,5 milhão de cirurgias plásticas por ano no Brasil. Deste número, 15% são lipoaspirações, sendo que um em cada 4 procedimento, as mulheres pedem que a gordura retirada seja implementada nos glúteos. Segundo Faustino, apesar dos riscos, o enxerto de gordura é considerado pela classe médica “como o mais seguro e o mais indicado” em casos de procedimentos nos glúteos.

Procedimento menos invasivo


No Brasil também há clínicas especializadas em lifting dos glúteos de uma maneira menos invasiva, sem precisar de um procedimento cirúrgico. O dermatologista, Ivan Rollemberg, sócio-diretor da clínica de estética Human Clinic, localizada na Zona Sul de São Paulo, viu um crescimento de mais de 400% no número de mulheres que procuram uma melhor definição na região das nádegas. 

— Eu fico muito feliz com o retorno. Mulheres que encontraram suas autoestimas, que podem vestir um biquini na praia e se sentirem bem com seus corpos. Muitas falam que houve até mesmo uma melhora no relacionamento com o parceiro depois dos procedimentos — explica Rollemberg.

O processo funciona como uma associação de técnicas em três fases de injetáveis: o primeiro é o ácido hialurônico, que é inserido nas partes superiores dos glúteos, perto da marca da calcinha, no intuito de melhorar a projeção e aumentar o volume das nádegas.

Também há o uso de bioestimuladores de colágeno para auxiliar na correção e diminuição do desnível na lateral dos glúteos, chamado de fossa trocantérica. Além de melhorar a qualidade da pele, flacidez e diminuir estrias e celulites.

Por último há a injeção de esvaziadores de gordura para refinar o contorno dos glúteos e reduzir a gordura localizada na lateral e na parte de baixo das nádegas, popularmente chamada de bananinha.

Há também um procedimento a base de fios de sustentação de PDO (polidioxanona), estimuladores de colágenos que são reabsorvíveis, ou seja, após um tempo ele some do corpo sem causar riscos à saúde da paciente, mas deixa o colágeno e a tração. A quantidade de fios que são colocados depende de uma análise detalhada do especialista e de qual é o desejo da paciente.

Carina Manssur, 60, é uma das mulheres que prefere fazer o procedimento no glúteo de forma não invasiva. Ela já fez três procedimentos com fios de PDO no rosto e fez pela primeira vez no bumbum. A segurança foi tanta que a arquiteta garante fazer os retoques todo o ano e outras cirurgias.

— As pessoas reclamam que não é para sempre e que precisa fazer um retoque anual, mas nada na vida é para sempre. A idade não perdoa, eu fiz não é para mostrar para ninguém e nem para me fazer parecer mais jovem porque eu sei que não vou ficar com menos idade, mas para levantar a autoestima. É para eu me olhar no espelho e gostar do meu reflexo, me achar relevante. Andar de biquíni pela praia fica bárbaro. Nós somos o nosso melhor investimento, se você está feliz com a sua imagem é o que importa — diz.

Recuperação


Além do retoque anual, o lifting de bumbum não invasivo requer duas a três sessões extras. Há também a necessidade de permanecer com os curativos por mais três dias e a recomendação médica é que durante este período a paciente durma de barriga para baixo.

Entretanto nada comparado com a recuperação da cirurgia invasiva, tida como a parte mais dolorosa da recuperação. São duas semanas sem conseguir sentar direito e ter que deitar com as nádegas voltadas para cima.

Nos Estados Unidos, por exemplo, há casas de recuperação especializadas nesse tipo de procedimento onde só recebem mulheres recém-operadas dos glúteos e há uma equipe de mulheres que cozinham e tratam de seus ferimentos 24h por dia até o final da recuperação. Os preços de uma estadia em um desses centros de reabilitação variam de 5 a 16 mil dólares.