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Psicóloga transforma dor em apoio a famílias que perdem bebês

Damiana Angrimani é a mãe da Manuela e de um bebê que não chegou a nascer

Psicóloga transforma dor em apoio a famílias que perdem bebês
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal
Psicóloga transforma dor em apoio a famílias que perdem bebês

A psicóloga do Instituto do Luto Parental, Damiana Angrimani , formada em 2012, encontrou na própria experiência de luto perinatal a motivação para dedicar sua carreira ao acolhimento de famílias que passam pela perda de bebês. Após enfrentar uma série de situações traumáticas durante o processo de luto pela perda de seu bebê em 2013, às dez semanas de gestação, ela decidiu buscar formas mais humanizadas de lidar com a dor e a invisibilidade que cercam o luto perinatal no Brasil. Ela também é a autora do livro "Perdi meu Bebê: uma companhia para atravessar o luto gestacional, perinatal e neonatal".

A profissional, que sempre sonhou em trabalhar com psicologia infantil, viu sua vida pessoal e profissional se transformarem após a perda. Durante o processo, ela enfrentou desde comentários inadequados de profissionais de saúde até a falta de preparo das instituições para lidar com o luto. Um dos momentos mais marcantes foi quando uma enfermeira, ao entregar o laudo que confirmava a ausência de batimentos cardíacos do bebê, parabenizou-a, sem saber do conteúdo do documento. Outra situação ocorreu quando uma atendente de laboratório demonstrou dificuldade em cadastrar o exame solicitado para o procedimento de curetagem, já que a paciente não era mais considerada gestante.

No hospital, para o procedimento de curetagem, teve que fazer uma passagem de ida e volta por um corredor com berçário. "Tem que ter outro jeito de fazer isso. E se não tem, eu vou inventar, eu vou criar. Porque desse jeito é muito violento. Eu não quero que outras famílias passem pelas violências que eu e tantas outras vivemos. Por isso, criei um espaço onde a dor é validada e ninguém precisa sofrer sozinho", reflete Damiana ao IG Delas.

Além disso, a psicóloga ouviu frases de senso comum, como "foi melhor que tenha acontecido no começo" ou "Deus tem um plano", que, embora bem-intencionadas, acabaram por invalidar sua dor. Até mesmo sua terapeuta, a quem admirava, disse em um momento crucial: "Era só um combinado genético, não era um bebê". Essa fala a fez questionar a forma como o luto perinatal era tratado no país e a impulsionou a buscar conhecimento e práticas mais humanizadas em outros lugares, como a Inglaterra, onde o luto é visto como parte natural do ciclo da vida.

Inspirada por essa experiência, ela começou a estudar e a implementar no Brasil práticas de humanização do luto perinatal. Em 2018, facilitou sua primeira roda de luto, um espaço seguro para que famílias enlutadas pudessem compartilhar suas histórias e se apoiar mutuamente. Desde então, o Instituto do Luto Parental, no qual ela é uma das fundadoras, tem se dedicado a oferecer suporte emocional, terapêutico e prático para famílias que perderam bebês, além de promover a formação de profissionais de saúde e a conscientização sobre a importância do acolhimento adequado.

Integrantes do Instituto do Luto Parental
Foto: Reprodução/Arquivo pessoal
Integrantes do Instituto do Luto Parental


"O luto perinatal toca na nossa vulnerabilidade diante da impotência da vida. É um luto que a sociedade tenta esconder, mas que precisa ser visto. A perda de um bebê não é um erro, é parte da vida. E precisa ser tratada com respeito e dignidade. No Instituto, caminhamos lado a lado com as famílias no deserto do luto, sem ditar regras, mas com firmeza, gentileza e presença autêntica", pensa.

O instituto, que conta com mais de 50 voluntários, oferece uma variedade de projetos, como rodas de luto, atendimentos terapêuticos, caixas de memórias e o projeto "Tecendo o Amor", que auxilia famílias na elaboração do luto. A psicóloga também realizou um sonho ao publicar um livro sobre o tema, contribuindo para a produção de conhecimento científico e para a visibilidade do luto perinatal.

Ela ressalta que, embora o luto pela perda de um filho seja sempre doloroso, a diferença está em como a dor é acolhida. "Quando você tem uma equipe preparada, que permite que você se despeça com dignidade e que valida a existência do seu bebê, a dor não deixa de existir, mas ela é cuidada e amparada", explica.

A psicóloga acredita que, apesar dos avanços nos últimos anos, ainda há muito a ser feito para que o luto perinatal seja tratado com a devida importância no Brasil. "Essas famílias existem, essas crianças existem, e sua dor precisa ser validada. Precisamos falar sobre isso, nomear e acolher", conclui.