Existe romantização da obesidade?

O debate sobre a romantização da obesidade entrou em destaque nos últimos meses. Entenda o que os especialistas têm a falar sobre esse tema

De acordo com o IBGE 61% da população adulta brasileira é formada por pessoas com sobrepeso
Foto: shutterstock
De acordo com o IBGE 61% da população adulta brasileira é formada por pessoas com sobrepeso

O debate sobre a existência de uma romantização da obesidade tem ganhado força na internet nos últimos meses. Especialmente após uma entrevista da bailarina Thais Carla ao podcast “PodDelas”, em que ela acusa o profissional que a atendeu, durante a gravidez, de gordofobia. A declaração da artista dividiu o público, entre aqueles que concordavam com ela e outras pessoas que a acusavam de romantizar a obesidade. A discussão levantou algumas dúvidas. Existe uma romantização da obesidade? O que os ativistas gordos e do body positive defendem? 

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Para o profissional da saúde Guga Fígueiredo, especializado em emagrecimento, algo como uma romantização da obesidade não existe, pois, segundo ele, não existe uma cultura massiva de incentivo ao ganho de peso, ou uma idealização de que o corpo gordo é um corpo perfeito. 

“As pessoas pegam falas de uma minoria e tratam como se fosse um pensamento massivo. São poucas as pessoas que ‘romantizam’ a obesidade, a maioria das pessoas com sobrepeso está tentando se tratar. As pessoas com sobrepeso são acusadas de romantizar a obesidade apenas por estarem vivendo uma vida normal, apesar da doença”, diz  Fígueiredo. 

Guga ainda acrescenta que pessoas que constantemente criticam pessoas gordas não estão preocupadas com a saúde, mas sendo apenas maldosas. Ele até mesmo aponta o caso de pessoas que colocam a própria vida em risco para atingirem algum padrão estético esperado e que mesmo assim elas não recebem os mesmos ataques que pessoas gordas. 

“Criticar e apontar o dedo não vai ajudar ninguém a tratar uma doença. É como se tivesse um alcoólatra e ao invés de você chamar ele para um centro de reabilitação e tentar desintoxica-lo, você fica ofendendo e colocando essa pessoa para baixo. As pessoas usam esse tipo de tratamento com as gordas. Elas são vistas como preguiçosas, em vez de serem acolhidas. Quando você critica e aponta o dedo, você não está ajudando em nada, na verdade, você está fazendo a pessoa apenas a se afundar, e a se sentir mais excluída e sem forças para lutar”, explica Guga. 

Em contraponto, com o retorno da moda dos anos 2000, alguns movimentos culturais têm chamado atenção. Como as recentes aparições da empresária Kim Kardashian, em que ela ostenta um corpo muito mais magro e sem as suas famosas próteses nos glúteos. Ditadora de tendências, especialmente de padrões corporais, a sua mudança de físico pode estar apontando para o retorno da visão de que apenas corpos muitos magros são bonitos. 


Desumanização 


Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, 61% da população adulta brasileira, em 2019, é formada por pessoas com sobrepeso. Contudo, apesar de serem uma parcela expressiva da população, a marginalização e a falta de acessibilidade ainda são problemas enfrentados por essas pessoas. 

É o que aponta a jornalista e ativista do movimento gordo, Genize Ribeiro. Ela explica que o ativismo gordo vai além do body positive, que prega a favor da aceitação corporação e a valorização dos diferentes tipos de corpos, sejam magros ou gordos. Enquanto o ativismo gordo, busca acabar com a marginalização e a falta de acessibilidade que pessoas gordas enfrentam, como a dificuldade de frequentar ambientes públicos ou até mesmo de ter acesso à saúde.

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“Hoje, no Brasil, mais de 50% da população é gorda e por isso não é aceitável excluir dos espaços públicos mais da metade dos brasileiros. E, para mim, o mais grave é o descaso com as pessoas na área da saúde, a sociedade cobra tanto uma ‘saúde’ das pessoas gordas. Entretanto, quando as pessoas gordas buscam um médico, buscam saúde, elas são completamente negligenciadas, a maioria dos médicos, independentemente do problema que você tem, vão te recomendar uma bariátrica", afirma a ativista. 

Genize também relata experiencias negativas que ela mesma já vivenciou. Ela conta que uma vez,  ao precisar ir a um hospital, após machucar a pernandevido a uma queda que sofreu, em vez de o médico examinar a sua perna machucada, ele apenas recomendou que ela fizesse uma bariátrica. A jornalista também conta que, em alguns casos, pessoas gordas são encaminhadas para fazer exames em clínicas veterinárias, já que muito centros de saúde não possuem equipamentos necessários para atender pessoas com sobrepeso. 

“O que ativistas fazem na internet é pedir por respeito e isso é o básico. A gente quer que o corpo gordo seja considerado um corpo humano e isso não é romantizar, é apenas ter respeito o básico”, argumenta Genize. 

A jornalista também critica o “o culto” ao corpo magro, em que muitas pessoas colocam a vida em risco para ter uma aparência socialmente aceitável. Ela também destaca como o corpo das mulheres nunca é visto como o suficiente, sendo as mulheres uma hora magras demais, gordas demais e até mesmo malhadas demais. 

“Você não vê comerciais de produtos para pessoas engordarem, o que vemos é principalmente é mulheres morrendo a todo momento em busca do corpo perfeito, como no caso das vítimas do chá emagrecedor, que morreram após ingeri-lo. Além disso, não existe um corpo perfeito, olha o caso da Bruna Marquezine, ela sofreu milhares de ataques por estar supostamente magra demais, ou no caso da Gkay, que sofre críticas, por fazer plásticas, mesmo que ela siga a cartilha social do que é belo. Independentemente do seu corpo, sempre vai ter alguém te criticando, é assim que a indústria da beleza funciona e lucra”,  aponta Ribeiro.