"Sempre imaginei que meu namorado passaria por racismo, mas jamais desta forma"

Amanda conta sobre o dia que recebeu mensagens de um desconhecido falando o quão ruim era ela se relacionar com um homem negro

casal interracial
Foto: amanda
casal interracial



"Eu e o meu namorado nos conhecemos por amigos em comum em Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul. Fui colega de faculdade de uma amiga da época dele de escola. Acabou que virei bem próxima dessa amiga, saíamos juntas e quando conheci ele, começamos a ir todos juntos. Ele queria algo comigo desde o início, desde que nos conhecemos e eu sempre levei tudo na amizade.

Ficamos uns bons meses, 4 para 5 pra ser mais precisa, sendo somente amigos. Depois disso começamos a conversar sobre talvez investir em algo além da amizade, porque fomos percebendo que tanto ele quanto eu já sentíamos algo além dessa amizade, sempre ficávamos muito confortáveis juntos.


Ele sabia que sempre quis namorar alguém que já tivesse uma amizade forte porque sempre admirei casais que começavam a namorar depois de uma trajetória bonita de amizade. E assim aconteceu. Começamos a nos envolver emocionalmente em agosto e cerca de 2 meses depois começamos a namorar.

O episódio de racismo

Eu sei que namoro com um homem negro e já estava 100% ciente de que episódios de injúria racial poderiam acontecer. Eu e o Jota sempre conversamos sobre isso. Porém, nunca havíamos passado por um situação similar, onde o ódio me fosse tão nítido.

O episódio de racismo começou literalmente "do nada", eu estava trabalhando e recebi uma mensagem de alguém que não me seguia e não me conhecia. O nome dele é Àlvaro. Ele começou a puxar assunto comigo abordando questões raciais e políticas relacionadas ao Jota, meu namorado. 

Inicialmente parecia apenas um flerte. Mas o racismo foi nítido quando fui alongando a conversa. O homem buscava, através de argumentos acadêmicos, apontar os malefícios de se estar com alguém de cor diferente da minha. Ele falava que meus filhos seriam diferentes de mim, que perderiam uma enorme carga genética prussiana e que eu não merecia estar com meu namorado.

Falava que os negros tinham um cheiro diferente e se eu parasse de me relacionar com eles eu poderia não me contaminar. Que eu e o meu namorado não éramos iguais, que os europeus eram superiores porque não se deixaram se misturar com os africanos. 

Vejo que isso afeta o mundo, porque é complicado digerir palavras como as que li do Álvaro. Elas vem carregadas do que, parece ser, uma sabedoria, uma inteligência, não sei como podemos chamar, justamente porque ele é um homem que possui instrução, e num grau importante da formação acadêmica e isso é o que mais machuca, saber que ideias de cunho preconceituoso estão sendo espalhadas.

Nesses momentos a gente precisa mostrar a indignação e demonstrar o quão contrário a isso somos. É aquela história "se diante do preconceito a gente continua no mesmo ambiente, a gente também tá disseminando esse preconceito". penso que aí cabe a nós, nos levantarmos e sairmos do ambiente quando ele viola a existência do outro. Eu, como psicóloga e fã da profissão que escolhi, jamais continuaria num ambiente que fere a existência de qualquer ser humano.

Apesar do Jota sofrer preconceito por estar comigo, temos uma relação de muita parceria. Vivemos a vida, a alegria, as tristezas e os desafios do outro. A maioria das pessoas entra em uma relação achando que parceria é alguém para sair, para ficar em casa olhando série, mas depois que a gente amadurece e traz esse amadurecimento para relação, a gente vê que parceria é além de ter alguém pra beber, viajar, se juntar com os amigos. E a gente tem esse "além" um no outro".