Se você tem um corpo, eventualmente, já se pegou pensando nele. Algumas pessoas gostam mais de seus corpos do que outras. Algumas mulheres são mais magras, definidas, outras têm dobrinhas e há aquelas que são gordas. E se existe uma coisa que une todas estas mulheres é a pressão estética .

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Estas mulheres têm corpos bem diferentes umas das outras, mas têm duas coisas em comum: recebem críticas e se amam
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Estas mulheres têm corpos bem diferentes umas das outras, mas têm duas coisas em comum: recebem críticas e se amam

Muitas mulheres lutam para alcançar um padrão de beleza , seja por um gosto pessoal ou em uma forma de fugir das críticas, mas será que as mulheres com corpos que estão dentro deste padrão têm histórias completamente livres de comentários alheios e muito diferentes daquelas que fogem do tal padrão?

Thais Carla, Ellora Haonne, Mayra Cardi, Rebeca Gusmão e Elaine Babo são todas mulheres, mas com corpos e histórias de vida bem diferentes. Em entrevista ao Delas , quase todas afirmam estar tranquilas com a forma física, mas a personal trainer e ex-nadadora Rebeca Gusmão mostra que é complicado ficar completamente satisfeita quando o próprio corpo é seu “cartão de visitas”.

“É meu instrumento de trabalho, sempre estou procurando algo para mudar. Parece cabelo: uma hora loiro, escuro, longo, curto, sempre mudando. Meu corpo, uma hora quero magro, forte, definido, mais bunda, mais perna, seca mais a barriga... E assim seguimos. Mas não fico ‘noiada’, é uma coisa mais natural, até porque não tenho tempo de ficar horas malhando.”

Hoje, a personal tem um corpo mais definido e magro, mais parecido com o da empresária Mayra Cardi e que lembra o da atleta fitness Elaine Babo. Elas, assim como a YouTuber Ellora Haonne, são mulheres que podem ser consideradas “dentro do padrão”. Entretanto, não é por isso que estão livres de críticas. Ellora, que tem algumas dobrinhas na barriga mesmo sendo magra, conta que já ouviu que é impossível ser bonita com essas características. Como uma pessoa que já superou um transtorno alimentar, ela encara esse tipo de crítica como “assustador”.

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Atleta fitness e ex-bailarina do
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Atleta fitness e ex-bailarina do "Domingão do Faustão", Elaine Babo já ouviu que tinha pernas de jogador de futebol

Já Elaine sempre foi bem magrinha e definida, mas, mesmo sem as dobrinhas que são alvo de críticas no corpo de Ellora, era criticada justamente por ser musculosa demais. “Hoje em dia, eu lido bem, já sofri muito mais! Eu sempre fui do biotipo magrinha, definida. Esse tipo de corpo é comum na atualidade, mas antigamente, nos meus tempos de colégio, não eram. Os meus colegas falavam que eu tinha pernas de jogador de futebol... Tive que aprender a aceitar meu corpo, foi um processo.”

Mayra, que já recebeu críticas por ter pernas e bumbum grandes no passado, afirma que, hoje, que está mais magra, não recebe críticas pelo corpo – ela chega até a ser muito elogiada pela cintura fina. Por outro lado, entende que estamos em um momento em que as pessoas não precisam de motivos para criticar. “Precisam apenas de uma conta no Instagram para se sentir protegidos e poder colocar para fora todas as frustrações que têm dentro, a raiva de não ser o que gostaria, de não ter o que queria ter, de não viver o que não consegue ou não pode... E por aí vai. A verdade é que o feed do Instagram não diz quem ninguém é de verdade, mas os comentários dizem tudo, você só pode colocar para fora o que tem dentro de você.”

Já Rebeca acredita que as pessoas não entenderam ainda que o corpo e a vida é de cada pessoa, não dos outros. “Eu não malho para agradar ninguém. Não preciso conquistar ninguém – já até sou casada”, brinca. “Eu preciso ter um corpo malhado porque sou personal trainer. Claro que sempre que saio as pessoas olham, algumas admiradas, outras com olhares críticos, mas no dia que eu precisar de uma opinião, peço para meu marido, ainda não resolvi fazer enquete para pedir a opinião das pessoas.”

Pressão estética vs. gordofobia

Antes de se tornar bailarina do programa Legendários e da cantora Anita, Thais chamou atenção no “Se Vira nos 30”
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Antes de se tornar bailarina do programa Legendários e da cantora Anita, Thais chamou atenção no “Se Vira nos 30”

A história muda quando a pessoa se afasta demais do padrão estético exigido das pessoas pela sociedade, como é o caso de Thais Carla. Ela é bailarina, mas não com o formato de corpo tradicional, bem alongado e magro.  Thais já ouviu que não existe bailarina gorda, que ela não conseguiria realizar um sonho apenas por conta do formato do corpo, mas provou o contrário.

Mas, pior de tudo, Thais já ouviu desconhecidos dizerem que não vai conseguir ver a filha crescer se continuar com o corpo que tem. “Falam que eu faço apologia à obesidade, que eu vou morrer, mas eu conheço tanta gente que já morreu antes de mim e era magro”, revela. No caso da bailarina, além de ter de lidar com a pressão estética, algo que atinge todas as pessoas, ela ainda precisa encarar de frente a gordofobia, que é o preconceito contra as pessoas gordas.

Felizmente, a dança fez com que bailarina desenvolvesse muita confiança no próprio corpo, algo que não acontece com todo mundo. “A gente precisa usar o que a gente tem. Eu sempre me olhei no espelho e me achei normal. A dança me deu muita autoestima, e não vejo problema em deixar a barriga de fora ou usar shorts curto, por exemplo.”

Mulheres sofrem mais?

Rebeca Gusmão acredita que as mulheres sofrem mais com a pressão estética porque se cobram mais e são competitivas
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Rebeca Gusmão acredita que as mulheres sofrem mais com a pressão estética porque se cobram mais e são competitivas

Segundo a psicóloga Rogéria Taragano, do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria da USP (Universidade de São Paulo), de dez pacientes em seu consultório, oito são mulheres. "Os transtornos acontecem cada vez mais com homens, e cada vez mais cedo, mas muito mais com mulheres. Estas questões acabam sendo muito mais cobradas da mulher. Basta você parar em uma banca de revista e ver quantas capas têm corpos de mulheres."

Ellora concorda ao dizer que nunca viu um homem se desculpar em um reunião, por exemplo, por estar sem maquiagem. “É a cara com que a gente nasceu, sabe, não temos que nos desculpar por isso. Parece que a nosso única obrigação é ser bonita. É inacreditável a diferença.”

Já Rebeca acredita que as mulheres, além de se cobrarem muito mais que os homens neste aspecto, também são muito mais competitivas. “Quer ser a mais bonita, a mais desejada, isso é do instinto feminino, não tem jeito. Se chega uma mulher bonita em um lugar cheio de mulheres, os olhares serão de todos os tipos. O homem só olha se for bonito. O homem quando se sente mal com o corpo dele, ele geralmente guarda para ele. A mulher externa mais, escreve para blogueiras, revistas, procura na internet formas de buscar o corpo perfeito rápido.”

Elaine pensa que, justamente por isso, a questão da pressão estética deveria ser mais discutida. Ela acredita que, ao invés de serem competitivas umas com as outras, as mulheres poderiam se ajudar, empoderando umas as outras. “Cada uma tem sua beleza. Nunca vamos vencer as críticas porque ningúem é perfeito. Mas podemos aceitar a diferença do outro e diminuir essa pressão estética.”

O perigo da pressão estética

Por um período da vida, Ellora ficava na internet olhando os chamados “corpos perfeitos”, que, na época, eram super magros, com os ossos realmente saltados. O desejo da jovem era ser assim, como as atrizes de capa de revista. A verdade é que a youtuber já era magra, mas a pressão que sentia para ser “perfeita” fazia com que ela não se visse dessa forma.

A psicóloga Rogéria entende que a pressão estética é um fenômeno social, uma mistura de elementos que formam o nosso momento cultural. Já os padrões são estabelecidos e reforçados pela mídia e as indústrias com interesse nesse tipo de assunto, como aquelas ligadas ao mundo FIT, alimentação supostamente saudável, moda e com outros interesses econômicos. “E propagar um determinado padrão de beleza ou estética acaba afetando uma série de pessoas, principalmente as mais vulneráveis.”

A especialista se refere àquelas pessoas que já têm alguma predisposição a desenvolver transtornos de imagem ou alimentar, seja por questões sociológicas, emocionais ou até mesmo pela genética. “Todo mundo se preocupa em se encaixar, mas alguns sofrimentos emocionais são mais significativos, chamam atenção e geram prejuízos à pessoa”, explica a psicóloga. A pressão estética se torna, então, um fator desencadeador de uma condição psicológica que a pessoa já tem, podendo levar a uma anorexia nervosa ou bulimia, por exemplo.

Hoje, Ellora conseguiu superar a bulimia e se entende como uma mulher magra. Ela sabe que, por ser assim, foi mais fácil para ela se aceitar do que se tivesse um corpo fora dos padrões. “Para quem sofre para alcançar um corpo, eu diria que o ‘lá’ não existe. Eu pensava muito ‘quando eu for magra’, ‘quando eu chegar lá vou conseguir isso ou aquilo’, mas eu não me dava conta de que esse ‘lá’ não existe. É um padrão inalcançável, irreal, uma corrida sem linha de chegada.”

Só depois de superar a bulimia é que Ellora se descobriu uma mulher magra e dentro dos padrões, mas foi um processo
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Só depois de superar a bulimia é que Ellora se descobriu uma mulher magra e dentro dos padrões, mas foi um processo

Uma forma de fugir dos padrões é buscar se espelhar em pessoas com corpos e características semelhantes às suas. Porém, nem sempre é fácil. Thais, por exemplo, se revolta por perceber que as mulheres e homens gordos são sempre retratados de uma forma estereotipada. A bailarina não tem nem mesmo em que se espelhar direito, já que “quem é gordinho só aparece em videoclipe/novela se a produção estiver tratando a obesidade como uma questão". Ela até lembra que só no ano passado uma atriz fora dos padrões conseguiu representar apenas uma mulher – e não uma mulher gorda.

“Uma vez só fizeram isso com a Mariana Xavier, ser gorda não era uma questão e mesmo assim ela estava lá, mas outros eu não vejo. Claro que melhorou muito já, mas as pessoas ainda não nos olham como igual, como qualquer um que está aqui. Essas propagandas que existem não são de pessoas reais. Até porque, pessoas reais soltam pum, andam feias em casa, têm estrias, celulite, não fica nesse ‘fake’. Eu duvido que a Juliana Paes, por exemplo, acorda sempre linda. As pessoas só tem de lembrar que a mais linda do mundo é sempre você mesma.”

Elaine reforça ao discurso ao sugerir que as mulheres busquem sempre o melhor, mas de acordo com a própria realidade. “Se você é uma mulher magrinha, procure ser a magrinha mais bonita que pode ser. Se for gordinha, seja a gordinha mais linda que puder. Se for baixinha, abuse do charme que tem em ser assim. A gente só é feliz quando busca a nossa melhor versão, não a dos outros. Isso é uma questão de olhar para si mesmo com amor.”

Preciso de ajuda

Mas calma, a gente sabe que nem sempre é fácil amar o próprio corpo. Sentir um desconforto vez ou outra é normal, mas se isso estiver atrapalhando a sua vida, pode ser que você esteja precisando de ajuda. Rogéria explica que quando uma pessoa passa a evitar determinadas atividades, eventos e até coisas que gosta só por conta de um objetivo estético pode ser sintomas de algum transtorno que está começando.

“Existem estudos que mostram que a maioria da população tem algum tipo de preocupação. O que vai diferenciar é o grau desse incômodo. A pessoa tem de começar a se preocupar quando isso toma uma dimensão muito grande e faz com que a pessoa viva em torno disso, só pensa nisso. Até mesmo amigos do mesmo círculo passam a ficar doentes também, e aí a pessoa acaba contando mais com a equipe médica do que os próprio amigos.”

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Mayra Cardi, cujo trabalho é justamente ajudar pessoas a emagrecer, alerta que não adianta querer agradar os outros
Facebook/Mayra Cardi/Reprodução
Mayra Cardi, cujo trabalho é justamente ajudar pessoas a emagrecer, alerta que não adianta querer agradar os outros

E até mesmo Mayra, cujo trabalho é justamente ajudar outras pessoas a conquistar determinados corpos, alerta que “querer um corpo novo porque este não te faz feliz está tudo bem, mas querer um corpo novo para se sentir aceito pelo outro está completamente errado. “Viver uma vida para o outro é viver na escuridão. A pessoa que vive para o outro nunca será feliz porque temos milhões de outros, e cada um deles têm outra opinião e será impossível agradar a todos. Agrade a você mesmo e seja feliz”, completa a coach. E se sentir que a situação está fora de controle, não hesite, procure ajuda. 

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