Mesmo interessados, algumas pessoas fogem quando chega o momento de se relacionar com a pessoa desejada.
Redação João Bidu
Mesmo interessados, algumas pessoas fogem quando chega o momento de se relacionar com a pessoa desejada.

Dez meses. Esse foi o tempo que a carioca Rachel Alvarez, de 37 anos, investiu na relação amorosa com Paulo Freitas, empresário que conheceu em 2018 e cujo nome real prefere não revelar. Uma situação rotineira na vida de uma jovem mulher que faz planos de se casar e, quem sabe, ter filhos, não fosse um detalhe: eram frequentes os sumiços do rapaz. Marcava e desmarcava encontros de última hora e sempre que Rachel aparecia nas redes sociais divertindo-se ou acompanhada de outros homens, ele voltava bem no estilo “oi, sumida!”. “Nos vimos poucas vezes, e ele realmente me iludia, porque sempre dava algum indício de que íamos nos encontrar. Acontecia de ficarmos um mês sem conversar e, de repente, ele mandava mensagem como se nada tivesse acontecido. Nessa época, eu não estava tão bem, minha autoestima era baixa. Com o tempo, descobri que Paulo era complicado e não queria de fato se relacionar, mas sim, ter uma pessoa disponível”, conta Rachel, que colocou um ponto final na história após começar um curso presencial sobre autoconhecimento e relacionamentos amorosos.

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Mais do que apenas “enrolar” alguém e não se comprometer, a atitude do empresário não é um caso isolado. Segundo especialistas, tem aumentado mais nesta geração por conta da interação virtual, via aplicativos de namoro ou redes sociais. E isso pode causar verdadeiros estragos na autoestima do outro. O nome? Breadcrumbing, ou, em tradução literal, espalhador de migalhas. No sentido figurado, o termo é usado por alguém que dá sinais de interesse sem ter intenções de seguir em frente. “Nos aplicativos você se torna um objeto, porque aquilo é um cardápio humano e tem efeitos psicológicos. Temos uma geração de pessoas que mantêm relações menos profundas, então, o sentimento de ser descartável aumenta”, explica o psicólogo e professor Rossandro Klinjey, de Campina Grande. “Até com a família há pouca conexão, e isso gera uma sociedade vulnerável, depressiva e ansiosa. Para ter estabilidade emocional, é preciso um enraizamento afetivo. Digo sempre para meus pacientes: quem se maltrata deixa a pessoa levar o lixo afetivo dela até você. Por que você recebe?”.


A fisioterapeuta Regina de Almeida, de 46 anos, diz não ter uma boa relação com a família, e acredita que isso possa refletir o fracasso nos encontros que teve ao longo dos últimos anos: sexo, algumas mensagens pelo WhatsApp e nada mais. “Ouvi críticas a vida inteira sobre minha aparência, meu peso, minha voz. Um dos caras disse uma vez que sonhou que tínhamos um filho e uma filha, que iríamos realizar isso e sumia. Na semana passada, teclei com um outro. Saímos às vezes para transar. Mas ele marca, some, depois reaparece”, lamenta Regina.

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Especialista em relacionamentos, a psicóloga Pamela Magalhães, de São Paulo, afirma que existem muitos motivos para que alguém dê migalhas afetivas: da simples intenção de curtir, passando por resistência de se entregar a uma relação, possíveis traumas ou ter uma personalidade narcisista, que favorece a manipulação. “Essas migalhas emocionais alimentam o ciclo de vulnerabilidade, fazendo com que o outro fique na expectativa e se frustre”. E quem aceita se submeter a isso, garante Pamela, ainda não reconheceu seu próprio valor. “É alguém que tem questões relacionais para serem ressignificadas. São pessoas com um histórico afetivo deficitário desde a infância, e que precisam reconfigurar suas crenças amorosas”, afirma.

Apesar de homens e mulheres terem a mesma possibilidade de serem “vítimas” dos espalhadores de migalhas, o psicólogo Rossandro acredita que eles expõem menos sua vulnerabilidade e, consequentemente, buscam menos ajuda. Renato Toledo (nome fictício a pedido do entrevistado), de 37 anos, envolveu-se com um rapaz que conheceu no Tinder e o resultado foram as já famosas migalhas de afeto. Como a relação não se desenvolveu, acreditou que o problema era com ele. “Ele dizia que eu era o tipo de pessoa que ele namoraria, fazia brincadeiras que se imaginava comigo velhinho. Mas ao final de cada encontro, sumia. No dia seguinte até conversávamos, mas o papo morria e, após semanas, ele voltava. Acho que ele dizia aquelas coisas porque era uma maneira de conseguir sexo fácil”, acredita. “Fiquei triste e me perguntei o que havia de errado comigo. Mas aos poucos, você percebe que a pessoa arma uma situação perfeita só pra te usar”, reflete.

E como não cair nessa cilada? Os especialistas são unânimes: é necessário prestar atenção aos sinais e trabalhar em prol da sua autoestima. “Reconheça seu valor, coloque regras e saiba entender quem você permite entrar na sua vida. A sabedoria nos protege de perfis como esses, que não oferecem consistência alguma”, finaliza Pamela.

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