Aos 42 anos, nascida no sertão de Pernambuco, filha de um professor de escola pública e mãe dona de casa, Fernanda Pessoa exibe uma trajetória que mais parece roteiro de novela. Aos 15 anos, engravidou como prova de amor do primeiro namorado. Ele foi embora, e ela ficou com a responsabilidade de criar a filha. O pai deu apoio moral, mas disse que ela deveria se virar para sustentar a criança.
Foi o que ela fez. Começou a fazer biscoitos para vender, depois quentinhas, salgados e sanduíches. "Eu estudava em escola particular, mas era pobre. Ouvi de professores que ali não era o meu lugar. Nunca tive um livro didático. Me destacava por fazer os trabalhos e prestar atenção às aulas. Não larguei a escola, não tinha essa opção. Queria ser médica na África", conta a atual dona de um curso pré-vestibular com alto índice de aprovação em todo o país.
"Lá em Arcoverde, só tinha licenciatura. Minha dúvida era Letras ou Matemática. Decidi por Letras, que me daria a chance de ministrar aulas de Literatura, Redação e Gramática. Tinha que pagar a faculdade. Vendia lanche no corredor da faculdade. Eu ganhei um livro de receitas quando tinha 7 anos. Eu usava ingredientes diferentes e fui fazendo comida para fora. Sempre digo que primeiro eu boto o pé, depois Deus bota o chão", diz Fernanda.
Com a faculdade terminando e o bufê rolando, a pernambucana tomou um tombo financeiro: emprestou cheques e não pagaram de volta. Ela resolvou ir para Recife tentar trabalhar para cobrir o rombo e sustentar a filha. Começou numa escola, da primeira à quinta série, mas não queria aquela grade, aquela educação. Mas foi ficando para pagar as despesas da filha e os empréstimos. "Durante dois anos me alimentei de bolacha e biscoito", recorda.
Fernanda Pessoa começou a dar aula particular e percebeu que a coisa fluia melhor. "Era do meu jeito, era intuitivo. Ainda fazia biscoitos e vendia aos sábados nas bancas de jornal. Aluguei uma sala, com a coragem de uma onça". Dos primeiros 13 alunos, oito eram bolsistas. "Sou uma indignada de como pode a sociedade determinar quem pode e quem não pode ter conhecimento. Eles teriam acompanhamento do jeito que eu acredito. O cursinho é muito frio, baseado em concorrência, eu não sabia o que era isso. Nunca fui uma pessimista. Eu queria fazer parte da vida das pessoas. Se der oportunidade para quem não tem dinheiro, você vai mudar a vida de outras pessoas", reflete.
Fernanda hoje impõe seu jeito de ser nas aulas que dá. E só dá aula descalça. O motivo? "Menina, não sei. Desde que consegui meu curso, chego toda montada, mas fico descalça pra dar aula. Tem aluno que diz: a aula só começa quando ela tira o sapato", conta ela.
Dos 13, primeiros alunos, só três não passaram no vestibular. Em 2007, Fernanda já tinha quase mil alunos. "Vendi um Fiat Uno e comprei uma viagem em promoção para a Itália. Queria dar a eles o conhecimento que eu queria ter. Fui para a Itália, sem saber inglês. Trouxe fotos e incorporei História da Arte no estudo para a redação. No final do ano: 70% do vestibular de medicina foi meu".
Em 2010, ela saiu da sociedade com R$ 5 mil, dinheiro que usou para construir o que hoje é um império de educação pré-vestibular, com mais de 100 funcionários, cinco deles com ela desde o início. Eram 5500 alunos no presencial até a pandemia. Desses, 1500 eram bolsistas.
"Fomos pro online, eu era contra, achava que ninguém ir ter paciência com as aulas. Hoje já são mais de 50 mil alunos no Brasil inteiro. A cada 10 mil, ofereço 500 bolsas. As aulas são sempre inéditas", diz a professora.
"Hoje percebo que a minha África é aqui. Deixamos as melhores memórias de cursinho para as pessoas. Aprovamos o primeiro menino trans em Medicina, a primeira menina trans. Apoiamos a equipe local na final do mundial de robótica e eles foram campeões. Tenho 5 turmas, cada uma com 550 alunos no presencial. No online, são mais de 50 mil. Dou aula de História da arte, Gramatica, Redação e Analise de texto. Eu sou uma ferramenta".
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